sexta-feira, agosto 31, 2007

Colônia de formigas em cativeiro?

A última discussão teve como tema a favela como um possível espaço de emancipação. O que me chamou atenção nos comentários foi a idéia de que as favelas poderiam ser alvo de uma política social externa (extrínseca) à realidade e aos desejos de seus habitantes - e isso merece algumas considerações que não cabem no espaço dos comentários. Ainda, por ser importante, parece-me que, somente sentar e esperar por uma solução que "caiba nos sonhos" da expansão do acesso ao conhecimento/informação (internet inclusiva) não é nada realista. Então, vamos ao trabalho.

No que toca aos projetos sociais de urbanização das favelas, as experiências de sucesso no Brasil são poucas, mas as que se concretizaram e apresentaram "bons frutos" têm sido aquelas que contam com um processo decisório do tipo "BOTTOM-UP", isto é, os moradores definem os critérios de construção, a paisagem arquitetônica desejada, o aproveitamento do solo e outros fatores que dirigem as ações públicas (ou seja, definem aonde e como querem ver aplicados os recursos). O nome disso é "orçamento participativo" e está ligado à democracia participativa - uma "novidade" no Brasil.


No exemplo/caso do Complexo do Alemão (dado por meu amigo André), parece que existe o que vou chamar de "beneviolência" do Estado: de um lado, o governo se predispõe a ajudar com uma infraestrutura social e, de outro lado, contribui para aumentar a violência no meio social. Bem, isso deve ser repensado. O Estado do Rio de Janeiro parece querer impor ou legitimizar o seu controle social, tendo por base ações de "ordem e progresso"; não é preciso uma grande inteligência para perceber que a segurança dos 250.000 habitantes foi posta em causa pela ação da polícia. Se aquele governo quer se livrar do tráfico de entorpecentes, que crie mecanismos que impeçam a entrada da droga na favela - entrar favela adentro com escopetas e rifles é que não parece coerente, a não ser que se trate de uma "guerra justa" (e toda guerra é fundamentalmente e axiologicamente injusta). Acho que é hora de todos nós pararmos para pensar se o espaço humano que chamamos "favela" deve ser alvo desse tipo de experiência social.

Quanto à sociedade de informação, sem dúvida nenhuma que ainda é preciso navegar muito antes de vermos uma inserção das populações carentes nessa área, pois ela ainda é tratada como um "mercado lucrativo"; é evidente que não haverá acesso ao conhecimento enquanto o acesso à internet for pago e não-democrático. Para isso, uma das boas políticas foi a idéia por trás do "computador para todos". Embora tal programa não tenha realmente assegurado os meios necessários (computadores) para a implantação de uma sociedade da informação no Brasil, nem tampouco ter democratizado o acesso à internet, a idéia original ainda me parece muito apropriada. Aí está uma bandeira de luta...

domingo, agosto 19, 2007

Favela: um espaço de emancipação?

(Brasil) Ao pensar a favela como um espaço de liberdade, posso estar a negar o fato de que lá estão enclausuradas milhões de pessoas (os excluídos) - não é este o meu intento. Nem também é minha vontade estabelecer a "favela" como o "espaço do pobre" - isso a "democracia brasileira" já faz por mim... O que gostava de ressaltar é que existe um fato interessante na co-existência entre a favela e o condomínio.

Nessa arrumação social, os mais pobres estão impedidos de co-habitar com os mais ricos, o que significa dizer que embora não possam morar juntos, os dois convivem, porque há o trânsito de pessoas - quer seja o rico que vai comprar droga à favela ou passa de carro em frente a ela (no caminho do trabalho) quer o pobre que trabalha no condomínio (ou que passa em frente a ele na volta do trabalho) e assim por diante. Isto é dizer: os dois estão isolados, como vizinhos, mas se reconhecem como tal - por mais que um tente ignorar o outro, encontram-se, inexoravelmente, nem que seja no Carnaval... O que isso quer dizer? Bem, uma das coisas em que podemos pensar é: um cenário em que os atores conhecem seus papeis numa peça sobre a injustiça; chegará um momento em que o oprimido vai tentar subverter a situação e clamar por justiça. Mas, como esse clamor ocorrerá numa sociedade majoritariamente cristã e hipócrita - ou não é do Brasil que falamos? [Defina-me "Brasil", por favor?]


Ora, nosso Estado é fruto de um crime praticado contra os índios que aqui habitavam. Interessante a desginação "índio", porque representa o cume da estupidez européia - quando os "descobridores" pensavam alcançar a Índia. Isso para não falar da massiva, cruel e imoral escravização dos povos africanos - que continua mascarada em nossa sociedade até os dias de hoje. Então, como é do nosso conhecimento, o primeiro crime na fundação do "nosso" País foi o massacre/genocídio/escravização de milhões de pessoas. Assim, seguiu-se a colonização que, no "nosso" caso, pressupõe a destruição da Mata Atlântica e a extração mineral, com vista a abastecer a Metrópole com os produtos primários com os quais os portugueses operavam no comércio europeu (metalismo). Com a crise política européia, advinda das guerras napoleônicas, e a crescente influência dos brasileiros ricos na Corte portuguesa, arquiteta-se o processo de independência - que estabelecerá, dentre outras coisas, uma dívida externa impagável, a reverter-se em favor dos credores ingleses - e a posterior formação da República - agora, com credores norte-americanos. Não é à toa que somos um País de corruptos; nossa história é a história do "crime de Estado". Seguiram-se vários governos, de maioria militar mas, majoritariamente de "homens brancos" (talvez, de facto, na totalidade). Mas então, "por que lutar por um Brasil de criminosos"? A questão não é essa.

O que se esconde por detrás dessa problemática é a contínua obliteração da capacidade política - capacidade intrínseca ao gênero humano, devido à vida em sociedade -, por meio de uma série de atentados contra a legítima e verdadeira participação popular no controle da política brasileira. Não se trata de outra coisa, senão de uma série de golpes e estratagemas que substituíram a possibilidade de uma verdadeira emancipação popular brasileira. A democracia no Brasil não foi e parece nunca deixar de ser apenas um projeto; quando podemos falar que ela realmente existiu? Um país como o "nosso", que nunca fez uma reforma agrária (democratização do acesso à terra), nem nunca promoveu uma real segurança social (democratização do acesso à vida digna), nem nunca promoveu o bem-estar social (democratização do acesso à riqueza), nem nunca promoveu a Educação para todos (democratização do acesso ao Poder), pode se dizer um "país democrático"? Penso que não. Mas eis que surge a figura da favela e sua "liberdade enclausurada", opondo o "Estado do crime" ao "crime de Estado"; ela é o avesso do avesso, porque se constitui num Estado paralelo que reproduz a violência que o Estado oficial pratica, só que de forma contrária ao Poder estatal formalizado. O Estado de ilegalidade que ali se exprime é o resultado da organização social do pobre; as pessoas que ali residem foram obrigadas a construirem suas vidas sob a mancha da ilegalidade, sem o apoio tecno-burocrático do Estado, em terrenos ilegais e habitações irregulares - sem saneamento, iluminação e outros serviços públicos. Qual é a origem étnica das favelas? A resposta a esta última questão deve vir da resposta de outras perguntas: para onde foram os escravos "libertos" da senzala? Para onde foram os expropriados dos terrenos do litoral?

Penso que as pessoas que foram "libertas" da escravidão construíram seus espaços dentro das cidades; porém, faltava-lhes um espaço de não-interferência e auto-determinação... a favela. Com base no "perdão cristão", os oprimidos esqueceram-se de toda a sua exploração e organizaram-se ao lado dos seus opressores. Será que das favelas irromperá, um dia, uma revolução social? Possivelmente. Mas, para justificar esta idéia, seria preciso discutir aspectos do sistema de crenças brasileiro (religião, cultura e formações étnicas regionais) e outras formas de coerção social, o que exigiria ir além deste reduzido espaço textual. O certo é que, mesmo diante de várias técnicas de controle social e/ou submissão pela força, a larga maioria da população que vive em condições de miséria, desigualdade e exclusão tende a se rebelar e eliminar as bases sociais e econômicas em que subjaz a exploração da vida humana - mais cedo, ou mais tarde. É uma idéia que merece reflexão e uma boa dose de paciência - ao contrário do que possa parecer (pela urgência da fome). Não quero dizer que somente o tempo resolverá isso, sem alguma intervenção consciente; pelo contrário, penso que a sociedade da informação e as condições econômicas precárias criarão as condições necessárias ao movimento de libertação democrática brasileira.

Se pensarmos em termos de entropia, a ordem social de exclusão que é imposta aos pobres (e garantida por meio do controle do aparelho de violência estatal) converteu-se numa energia criativa, convertida em um movimento de desorganização social. Isso porque, da interação entre os espaços urbanos (favela e condomínio), surge uma nova organização social (híbrida), que vai canibalizando e mesclando as classes sociais. Essa energia criativa é a liberdade (ou o verdadeiro "fim da escravidão"), a não-interferência e, quem sabe, a esperança de emancipação das camadas pobres das grandes cidades brasileiras.

Lembre-se de Conselheiro...
***
P.S. - Outro dia pensei na origem da expressão "você está legal?" (ou seja, "está tudo bem com você?"), que nós brasileiros usamos no cotidiano (os portugueses não a entendem)... Não existe algo de escondido na transfiguração da palavra "legal" (que é um termo jurídico) para o significado de "bem estar"? Talvez, a origem desse significado e sua utilização devam algo à linguagem que se fala nas favelas.

sexta-feira, agosto 17, 2007

Você entende o que está acontecendo?

Eu não entendo. Na realidade, estou um bocado confuso. De um lado, se todas as informações apontam para uma culpa generalizada do Partido dos Trabalhadores (PT) pelo mar de lama que corre no Brasil, como posso me sentir em relação a isso? De outro lado, como posso acreditar que os aparelhos de comunicação social privada estejam todos falando a verdade? Temos um paradoxo, no Brasil.

O governo Lula foi re-eleito com massiva aceitação popular - principalmente no Nordeste. Desde então uma série de perguntas passaram a pulular no meu raciocínio: o que essa re-eleição signigicou em termos democráticos ao povo (principalmente, ao pobre)? Será que a expressão "povo brasileiro" (vá lá saber o quê isso significa) não se aplica à população do Norte e Nordeste do Brasil? Ou, de outra forma, só é "verdadeiro" o que é ditado no Sul e Sudeste - isto é, os nordestinos e nortenses não têm voz? Ou, pior ainda, "o povo está sempre errado"? Isso me faz lembrar a "teoria da duplicidade" (alicerce do sistema representativo da revolução liberal de 1789).

Eu começo a pensar que Baudrillard tem razão, quando filosofou que vivemos numa era de obscenidades; a categoria do transpolítico está submersa na obscenidade (a política e o social passaram a ser categorias submetidas à estratégias banais).

Ou seja, eu fico vendo o rico reclamar que o pobre está mal. Será? Só estou confuso com tanta corrupção rondando o gabinete presidencial. Afinal: culpado ou inocente?

"Arbeit macht Frei"

"O trabalho liberta" (arbeit macht frei): era isso o que os judeus, eslavos (iugoslavos, polacos etc) e ciganos liam todas as vezes que entravam nos campos de concentração europeus, durante a segunda guerra mundial. Bem, pelo menos os que ficavam vivos...

Tirei esta foto em Auschwitz, em outubro de 2004. Nunca me esqueci do passeio... os portões do museu do Holocausto ficam sempre abertos, dia e noite - ato simbólico em favor da liberdade.

Esta eu dedico a todos os políticos e empresários brasileiros que pensam que "o trabalho liberta".

quinta-feira, agosto 16, 2007

Notícias de Cuba: os atletas vão bem?

É humilhante ter que explicar aos meus colegas portugueses a atitude do Ministério da Justiça do Brasil na deportação dos atletas cubanos que fugiram da Vila Olímpica, durante os jogos pan-americanos de 2007. Não há explicação!

A melhor resposta que lhes posso dar é: foi uma decisão fundamentada na lei - na leitura pura e seca da lei; num positivismo tacanho e recalcado. Uma vez que o governo brasileiro reconhece a legitimidade do governo cubano, os atletas não poderiam pedir asilo político. Mas deportá-los em 48 horas? Isso é um absurdo!


Vá lá que o Partido dos Trabalhadores (PT) esteja a fazer uma manifestação de apoio ao governo cubano; não seria um pedido de socorro: "Aceitem-nos, somos da esquerda!"? Era a altura para propor uma alteração designativa daquele Ministério: da Injustiça.

Só temos um pequeno problema a tratar: enquanto perdurar a cidadania do Estado-nação (Hegel), as pessoas não terão o verdadeiro direito de ir e vir.

Precisamos defender o "cidadão global" - mas isso é questão para outro post.
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Links relacionados com este post:
JBOnline: Procurador avalia deportação de atletas cubanos pouco transparente.
Blog do mesquita: Opinião - Extradição, atletas e traficante.

Reeleição sem limites?

O governo democrático da Venezuela, encabeçado pelo presidente democraticamente eleito Hugo Chávez, prepara-se para aprovar uma emenda constitucional que põe fim ao limite de reeleições presidenciais. Assim, o chefe do Executivo estaria submetido às mesmas regras aplicáveis aos parlamentares (Legislativo), e a continuidade do chefe do Executivo no gabinete presidencial estaria sujeito apenas à escolha democrática popular.

Os conservadores de carteirinha (liberais e neoliberais) preparam toda sorte de argumentos para atacar as pretensões políticas venezuelanas. Acusam o atual presidente venezuelano de populismo, criticam-no em sua postura perante à mídia e lançam toda sorte de ataques pessoais contra aquele governante. O fato é que o hermano continua a fazer "sucesso" e a ter apoio popular; o último referendo (2004), convocado pela oposição à Chávez, resultou na massiva aceitação da continuidade de Chávez na função executiva; ora, a "ditadura da maioria" é um argumento utilizado pela direita todas as vezes que o povo não vota "como deve votar", isto é, a democracia é confundida com populismo todas as vezes que o povo chega ao poder? Ainda, a mídia hegemômica (principalmente as grandes redes de televisão influenciadas pelo capital internacional privado, como a Rede Globo - multinacional brasileira) acusa Chávez de ter "fechado a RCTV" - fato que teria trazido a censura e a ditadura de volta à Venezuela. Bem, isso também é um fato deturpado, porque a RCTV não foi fechada; o correto é dizer que a concessão da RCTV não foi renovada, em função do que os juristas chamam de "poder discricionário" do chefe do Executivo (que tem a prerrogativa de renovar ou não renovar a concessão). Então, espere um momento. Os Estados Unidos da América acusam o governo venezuelano de "controle da mídia"? E o que acontece nos E.U.A. não é também manipulação da comunicação social? Qual foi a cadeia de televisão norte-americana que se opôs à guerra do Iraque do governo de Bush II? Nenhuma, porque isso afetaria os lucros estonteantes que a guerra proporcionaria (e tem garantido).


E qual parece ser o "grande mal" da reeleição sem limites? O que primeiro vem à cabeça dos analistas políticos são as origens da democracia representativa ocidental, durante a mordenidade. O liberalismo e o poder burguês trouxeram consigo a rotatividade dos cargos eletivos, para que não houvesse a "perpetuação do Poder pessoal". Contudo, não se pode analisar um fato histórico dissociado de todas as outras dinâmicas sociais que o influenciam. É evidente que o absolutismo havia sedimentado no pensamento moderno a idéia de pessoalidade da soberania, contra a qual o liberalismo se opunha (em certa medida e de acordo com os interesses da classe burguesa). Assim, fez-se de tudo para que as sucessivas e periódicas eleições tornassem possível a rotatividade do exercício do poder soberano, que transitava nas mãos dos políticos eleitos - e o resto é história.

Entretanto, algumas vozes têm se levantado no sentido de defender a reeleição ilimitada do chefe da Função Executiva, e uma delas é Mark Weisbrot. Em notícia publicada na BBC|Brasil.com, Weisbrot argumenta que se Chávez está sendo acusado de ditador, "então pode-se dizer o mesmo de Tony Blair ou de Margaret Thatcher, que permaneceram anos no poder, já que não há limites para a reeleição na Europa. Você só sai quando perde." (BBC|Brasil.com, 16/08/2007).

Agora é esperar pela verborréia da mídia latino americana que, sem dúvidas, irá condenar fortemente o processo democrático que se desenrola na Venezuela.

Chega de corrupção! 2

Concordar com o Arnaldo Jabor é dose, mas quando ele tem razão, o que fazer?

terça-feira, agosto 14, 2007

Ser humano, sem enganos

Cada um de nós tem seus limites. Todos nós vivemos imersos em "campos de crença", porque isso faz parte do "ser" (sein). Ser um idealista é querer transformar o mundo, e todos os idealistas são confrontados pela praxis; o maior desafio da vida é seguir adiante com ideais, planos e projetos para o futuro, senão, não somos mais que ferramentas - e a vida traz consigo a liberdade em trilhar caminhos alternativos à existência que nos é imposta.

Espero que meu leitores não tenham nenhuma ilusão quanto à minha conduta. Sou apenas mais um dos brasileiros que sonha com um futuro melhor. Mas não sou santo; conheço cada uma das minhas várias limitações e lido com cada uma delas com muita energia, para que o meu "eu" não se volte contra os mais fracos e oprimidos. Tenho plena consciência da força dos meus argumentos e da minha vontade de sobreviver - só me questiono: estou inserido numa cadeia alimentar, ou tenho que agir com solidariedade? Se eu tiver que me comportar como um animal competitivo, tenho que ignorar o "outro" (alienação). Se tiver que agir solidariamente, tenho que me comportar com vista a preservar a vida dos mais fracos. Acredito que os mais fracos não têm voz, por isso tento defendê-los. Não é isso que deveríamos fazer? Não temos que lutar por um futuro melhor? Não é preciso um planeta habitável e uma sociedade mais justa?


Não pretendo prever o futuro... não tenho nenhum poder sobrenatural, nem sou capaz de vencer as limitações que o mundo me impõe. Apenas penso num futuro melhor. Penso que isso é o quê cada um de nós deve fazer. Se um dia tivemos liberdade, ela deve nos guiar em direção à vida; uma vida com significado, na qual cada ser coopera para a satisfação do bem comum e não só em função dos seus interesses particulares. Conheço cada uma das maldades do mundo - como você também conhece. Sei que somos co-responsáveis por cada uma das alienações com as quais convivemos, ativa ou passivamente. A diferença que fazemos reside na nossa habilidade em converter o sofrimento em ternura. Saber transformar a dor em tranqüilidade é um dos dons de quem sabe compreender o que vai na alma humana.

A magia da vida reside na aptidão que temos em transformar nossas crenças e vencer nossos limites pessoais. Solucionar os problemas da humanidade passa por vencer nossas limitações e desafiar nossos instintos animais, sem negá-los. Se soubermos ser "bons animais", estaremos em contato com o mundo que nos cerca e poderemos interagir melhor com o ambiente do qual somos parte indispensável. Não é a realidade o grande desafio à psique humana?

Heloísa, uma menina que cresceu...

O Brasil ainda respira o cadáver da ditadura; é preciso sepultá-lo. Aqueles que nos oprimiram, que castigaram injustamente as nossas famílias, já começaram a "passar desta para melhor".

Não precisamos ter rancores pessoais. Mas não podemos deixar que "aquelas famílias" continuem no poder, jogando ovos na civitas. Se escolhemos a democracia, temos que arcar com o peso dessa decisão; não deverá haver justiça popular, nem inimigo do Estado. Em momentos de crise, é preciso ter calma. A direita estava sedenta por um golpe de Estado nas últimas eleições presidenciais. Conseguimos contornar a manobra e desativar sua estratégia. As eleições prosseguiram e o povo tomou a sua decisão - boa ou má, foi a decisão do povo.


Foi por isso que me preocupei com Heloísa. O momento da re-eleição era um momento para (o que resta) (d)a esquerda brasileira" manter a calma. Não podemos aceitar uma revolução no Brasil que deite sangue à terra; disso já se encarregaram os ditadores que tivemos, durante toda a nossa história. Agora, podemos construir um projeto para o futuro; e o futuro é agora.


Heloísa Helena, eu espero que você chegue lá.

Lula não é Sassá Mutema

Estou ficando cada vez mais preocupado, porque me sinto cada vez mais idiota, inútil e estúpido. Ou tudo o que eu penso é uma tremenda idiotice, ou todos são loucos. Não encontro outra explicação.

Sabe qual é o problema? Não é só a corrupção, nem a falta de memória popular, nem o desinteresse, nem a malandragem... poxa. Não é nada disso! É uma coisa mais simples, mais óbvia e palpável. É algo como: 40 milhões de pessoas que passam fome, mais ou menos 1 milhão de pessoas que são "proprietárias do Brasil" e 148 milhões de paspalhos que não sabem o quê fazer.

Imagino que a imagem dos miseráveis seja tão aterradora que consiga conter qualquer insurreição - e isso não só no Brasil, mas em qualquer país. Olhar uma pessoa "dobrada de fome" (como uma imagem que vi) dói no orgulho próprio de qualquer pessoa - sabemos que somos responsáveis por aquela "imagem". Quando interiorizamos a dor de alguém, é como se a vivêssemos. O que ocorre nessa "experiência sensitiva"? Ao invés de ajudarmos, queremos estar o mais distante possível daquela situação? Temos que trabalhar e cuidar "dos nossos familiares" (primeiro o meu!), tentando evitar a imagem da fome (um fantasma que nos assombra)?


Enquanto isso, a maioria da classe política brasileira nada em dinheiro. Nada do verbo nadar! 140% de reajuste aos cargos de confiança (Federal). O que me deixa espantado é que as pessoas ainda pensam que haverá um Sassá Mutema, um "Salvador da Pátria" que nos tirará deste mar de lama! Os jogos políticos são tão complexos que alguém poderia afirmar que não é possível determinar aonde começa a corrupção e aonde acaba a política - corrupção e política parecem sinônimos.

Meus amigos, nós não fomos enganados. Nós nos enganamos, o que é diferente. Somos tão culpados como eles. Se você chegou até este ponto no texto e o compreendeu, é porque você não está entre os 40 milhões de miseráveis. Entretanto, é um dos idiotas, como eu, que não sabem o que hão de fazer.

Os escândalos vão se acumulando e sendo herdados e recriados, governo após governo. O Presidente da República acaba por levar a culpa, porque afinal, ele pode sempre destituir o Congresso... "né?" Na verdade, o que isso demonstra é que o "bode expiatório" existe para que os verdadeiros culpados (congressistas) possam sair ilesos de responsabilidade no próximo pleito eleitoral.

Escândalo: descrédito causado por conduta irreligiosa/ímpia (1581, francês medieval).

Mais novelas brasileiras..

Cartéis, governo e Congresso.

Chega de corrupção!

Fantástico, o vídeo. Merece ser publicado. Então, lá vai.

segunda-feira, agosto 13, 2007

Meu amigo Foca

(Nota de agradecimento, do autor aos amigos)

Foca, você foi um dos novos alunos da Faculdade (das minhas turmas de primeiro semestre) que, em 2006, demonstrou melhor capacidade retórica, pelo menos, em minha disciplina.

Me lembro muito bem quando surgiram, em minhas turmas, as pessoas que fizeram a diferença. Tive, então, a oportunidade de dividir meu "espaço de conhecimento" com pessoas geniais. Este é o meu agradecimento que estendo a outras pessoas com quem trabalhei, aí em Fortaleza.

Sinto que criei um elo intelectual com algumas dessas pessoas, por isso, me preocupo tanto com o meu "standard autopoiético". Me preocupo com o que meus ex-alunos lêem. Por isso, vou colocando neste blog o quê eu leio, para que eles e outros com quem me relaciono possam saber o quê eu penso. Acho que todos temos algo a dizer. Por isso, os comentários são livres aqui! Essa liberdade confere expressão sem pré-julgamentos, porque pode ser exercida anonimamente.


Aqui, eu tenho enfrentado alguns desafios. O maior deles foi aprender a me conhecer. Não tem sido fácil... "o que somos" é uma equação complicada. Na categoria abaixo (Schutz: 1953-1954) eu adiciono os elementos "aluno" e "colega de trabalho":

"Only a very small part of my knowledge of the world originates whitin my personal experience. The greater part is socially derived, handed down to me by my friends, my parents, my teachers and the teachers of my teachers" (A. Schutz, "The Frame of Unquestioned Constructs". In: Excerpts from A. Schultz, Collected Papers; I. The Problem of Social Reality, Martinus Nijhoff, The Hague, 1967, pp. 13-14, 33, 61-2, first published in 1953 and 1954).
Tenho muitas saudades do Ceará. Mas ainda há estudos aqui a fazer. Me entristece muito ter pedido demissão da Faculdade, porque foi uma experiência enriquecedora; utilizo-me de uma metáfora, para explicar o que ocorreu: foi necessário cortar meu cordão umbilical, antes de sofrer qualquer tipo de castração (são fases superadas de minha vida). Em meu coração, permaneceram apenas lembranças boas: as pessoas com quem lá convivi.

Sugiro uma leitura interessante a você, Foca (já que estás a ler o Foucault): procure a página 23 neste documento "Microfísica do poder", e leia a secção III, "Sobre a Justiça Pupular". Veja o diálogo entre Foucault e um maoísta, e veja o debate e analise o pensamento de Foucault - coloque-se no lugar dele e pense como você reagiria. Eu me preocupo com os rumos do Brasil com medo e cuidado pelas pessoas que aí habitam. Não gostaria de passar pela experiência de meu pai, que é "jovem durante a ditadura" (se bem que minha juventude ainda dura uns 15 anos, espero).

Estou trabalhando/pensando com pessoas fantásticas. E queria dedicar um carinho especial a algumas delas, em especial: Francisco, Pedro, Filipo, José, Jorge, Raphael, B.S.S., M.P.M., A.C.F(*2), Lourenço, Sara, Patrícia, Telma, Tião, Alex e às demais repúblicas da Alta.

Sinto saudades tremendas da Sandra H., Anna Luiza, Flávio, Gérson, Ivo, Alexandre F., Carlos Nativo, André, Marcos, Lêda, Antônio, Marísia, Anísia, Itamy2, Neyde, Francisca, Itamy1, Chilton, Graça, Jório, Chiquinho, Cid, Ernesto (já há muito!).

O valor desta saudade é alto! Luto para não decepcionar ninguém, por isso, tenho dado o melhor de mim. E agora, novas promessas estão sendo feitas - e serão cumpridas.

Eu só tenho a agradecer, sempre, a visita daqueles que me conhecem. Porque aos que aqui chegam e não me conhecem, só posso dizer "bem vind@".

domingo, agosto 12, 2007

Brasil: uma potência mundial.

O Brasil é uma das potências mundiais. Quem diz que o Brasil é um país pobre, não sabe o que fala! Estas afirmações são feitas com base nos números (IBGE, Balanço econômico nacional), que podem ser consultados no site do instituto:

(2004) - Produção: R$ 3.432.735.000.000 (três trilhões, quatrocentos e trinta e dois bilhões, setecentos e trinta e cinco milhões de reais).

(2004) - Consumo: R$ 1.766.477.000.000 (um trilhão, setecentos e sessenta e seis bilhões, quatrocentos e setenta e sete milhões de reais).

(2004) - Renda nacional bruta: R$ 1.883.017.000.000 (um trilhão, oitocentos e oitenta e três bilhões e dezessete milhões de reais).

(2004) - Produto interno bruto: R$ 1.941.498,000.000 (um trilhão, novecentos e quarenta e um bilhões, quatrocentos e quarenta e oito milhões de reais).

O Brasil é um dos maiores exportadores de produtos e de capital do mundo! Opa! Capital? Sim! O Brasil é um país capitalista, e como!


O Brasil exporta capital, ou seja, é um dos grandes investidores mundiais, mandando divisas ao mercado internacional, através de suas inúmeras multinacionais: SADIA, BUSSCAR ÔNIBUS S.A, CAMARGO CORREA, CIA SUZANO DE PAPEL E CELULOSE, CIA. VALE DO RIO DOCE, CITROSUCO PAULISTA S.A., COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV, COMPANHIA SIDERÚRGICA NACIONAL, DURATEX S.A., EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A., EMPRESA BRASILEIRA DE COMPRESSORES S.A. - EMBRACO, IKPC – INDÚSTRIAS KLABIN DE PAPEL E CELULOSE S.A., MARCOPOLO S.A., METALURGICA GERDAU S.A., ODEBRECHT, PETROBRAS, SABÓ INDUSTRIA E COMÉRCIO LTDA., SÃO PAULO ALPARGATAS S.A., SUCO CÍTRICO CUTRALE LTDA., TIGRE S.A. – TUBOS E CONEXÕES, USINAS SIDERÚRGICAS DE MINHAS GERAIS S/A – USIMINAS, VOTORANTIM ( Votorantim Participações)

Eu não sei por que pensava que o Brasil é um país pobre!
Que grande surpresa, estive enganado esse tempo todo.
Mas, então, qual é a explicação para as mazelas deste país?

A primeira delas é a corrupção (política e societal). O Brasil tem uma população políticamente desengajada; não protestam e, quando o fazem, são massacrados pelas forças públicas de segurança. A corrupção, assim, é prática rotineira, afinal, o povo é manso e... calado!

A segunda, reside no descompromisso da parcela intelectual brasileira que mama nas tetas do Estado ou vive acuada com medo de perder cargos/empregos/vantagens. Ora, trabalhador com medo é trabalhador subserviente e... calado!


A terceira, é uma juventude seduzida pelo mercado de consumo, os goods do sistema de exploração brasileiro. Quem os pode comprar, deseja assim continuar fazendo, às custas da miséria da maioria. Só existe miséria porque existe riqueza! E quem não pode consumir... bem, mata, rouba ou, simplesmente, aceita... calado! Ou você pensa que todo mundo que mora na favela é bandido?

A quarta, existe um memory hole no Brasil a ser constantemente preenchido diariamente com assuntos importantes: futebol, telenovelas, programas de entretenimento... Ou então, festas, carnavais, forrós e tudo enfim. Não é pela alegria que o povo brasileiro é conhecido internacionalmente? Somos tão simpáticos e... calados!

Eu poderia seguir em frente. Mas a mais importante razão para a nossa miséria é a elite estúpida e "competente" (competência em que mesmo?) que comanda este País! Dizer que o Brasil é um país pobre porque o brasileiro não é apto ao trabalho é uma alienação (alienação = "ignorar o Outro" - categoria: Lacan; psicanálise).

Não Veja...

Eu fico me perguntando "até quando" os mecanismos da propaganda da direita vão continuar a "idiotização" da classe média brasileira (aquela, que quase desapareceu durante a ditadura militar e os 08 anos de governo FFHHCC!). Um desses canais de "estupidização" da parcela da população que sabe ler/escrever (e "interpretar" a informação) é a revista Veja.

Bem, eu te digo uma coisa: não veja a Veja! Ou veja, mas não "escute".

Se você fizer uma investigação para descobrir de que lado alinham os "pensadores" daquela revista, vá ao site e constate você mesmo: os sorrisos daquela magazine (nunca uma designação foi tão apropriada!) sempre estiveram voltados ao acúmulo de capital.

  • Em busca do "cálice sagrado"
Qual é a reportagem da Veja que fala sobre distribuição de riquezas?

Ah! Primeiro, claro, instale o navegador da Microsoft (porque o site não funciona bem com linux... o que será que isso quer dizer?).

Eu fiz o teste: vá no site da Veja e coloque a expressão entre aspas "distribuição de riquezas", escolhendo a opção "Notícias". Clique "ok". Sabe quantas reportagens aparecerão com este tema: ZERO.

Obrigado Veja, pelo des-serviço que você presta à nação brasileira!

(Obs: pesquisa realizada no dia 12/08/2007, entre as 12h01min. e as 23h48min.)

sábado, agosto 11, 2007

A nova crise no mercado financeiro internacional

A nova crise da bolsa de valores norte-americana é mais um sinal da falência da exploração capitalista selvagem em solo yankee. É o prenúncio de um novo comércio internacional que tem na Índia e na China o seu epicentro.

Este endereço (link) proporciona uma breve e simples explicação para entender o fenômeno em causa.

Mas, por que a China e a Índia? Bem, ao que tudo indica, eles apresentam as características essenciais ao desenvolvimento da indústria capitalista: muitos trabalhadores (são os países mais populosos do mundo), muitos investimentos estrangeiros (capital necessário ao início da produção), altos índices de concentração de riquezas (na Índia, o sistema de castas e, na China, o capitalismo de Estado), tecnologia própria e parcerias com outros países periféricos e semi-periféricos (de investimentos e compra de matérias primas em África, à parcerias com a América Latina e até Estados Unidos da América).

Para uma leitura sobre este fenômeno, sugiro o livro de Wladimir Andreff (professor @ Université Paris 1) intitulado "As multinacionais globais" (1995).

terça-feira, agosto 07, 2007

SiCKO: uma sociedade doente...

Saúde pública? "Não."
Novo filme de Micheal Moore dispara contra a propaganda do "american way of life". Abordando a prestação do serviço de saúde nos E.U.A, o cineasta mostra como a total privatização dos serviços médico-hospitalares é amparada pelo discurso anti-social da democracia representativa conservadora norte-americana. Uma das perguntas mais interessantes que o cineasta coloca, de forma indireta, é: "porque o sistema de ensino, os correios e outros serviços são públicos e gratuitos, menos a saúde?" Bem, a resposta é óbvia: as corporações que controlam a segurança social norte-americana faturam alto nesse setor.

O realizador vai de Cuba à França para fazer uma crítica severa daquilo que entende como assalto à dignidade dos cidadãos de seu país; foi uma das experiências cinematográficas mais revoltantes que tive; revoltante porque vejo que a prática denunciada no filme está se alastrando pelo mundo, junto com a globalização neoliberal. Da próxima vez que você ouvir um norte-americano perguntar "Why is this happening to me?", responda-lhe: "Relax, baby! It's the american way of life".


  • Mais (Dinheiro) > Menos (Interesse coletivo)
Eu tomo a liberdade de ir além do argumento ofertado por Moore. Constato que uma coisa é fato: tenta-se reproduzir em todos os lados a mesma disciplina que faz prevalecer os interesses privados sobre os públicos; isto é um projeto de desconstrução do coletivismo em função da superposição do individualismo exacerbado. Toda e qualquer área de alta lucratividade logo se transforma em objeto de desejo corporativo/empresarial submetido à privatização.

É bem que se diga que tudo aquilo que é imprescindível à vida pode se converter numa área de exploração econômica; desde os mananciais ao D.N.A, tudo pode ter (e acaba tendo) um valor/preço - esse é o "mundo" em que vivemos, hoje. A mercantilização da vida já começou; a manipulação/alteração de genes por empresas de biotecnologia já é fato consumado, desde a famosa Dolly; a vida pode ser patenteada.

Contudo, outro caminho é possível: a defesa dos bens que pertencem ao patrimônio comum da humanidade. É preciso definir quais são as áreas de interesse humano que devam ficar fora do mercado; é este o desafio que se coloca aos intelectuais no século XXI. Estes devem concentrar esforços que sejam capazes de sensibilizar as populações acerca dos reais valores incutidos nesses bens (públicos, coletivos, gerais, humanos), lutando pela inalienabilidade dos mesmos: a água; o código da vida; os espaços urbanos e naturais; a cultura etc.
  • Informática: um outro exemplo
Ao longo da História, a informação converteu-se num bem de primeira necessidade aos seres humanos; desde a palavra falada à escrita e desta à Internet, a informação incorporou-se como ferramenta imprescindível à vida humana - sem ela, não há significado, nem significante.

Existe um movimento, encabeçado por empresas do porte da MicroSoft, IBM e Oracle, que luta contra o software livre (linux e aplicativos freeware). Nos E.U.A., chega-se ao ponto de afirmar que o software livre é uma ferramenta comunista e, portanto, contra o valor liberdade. Esse argumento faz parte da retórica do período da Guerra Fria; os norte-americanos (e grande parte da população Ocidental) foi massacrada pelo constante bombardeio ideológico de matiz liberal, que anunciava o fim do mundo pela mão soviética... quando, na realidade, ambos os lados em conflito (URSS e EUA) tinham prontas suas ogivas nucleares, numa guerra de dissuasão pelo controle do continente europeu (e do mundo). Nesse aspecto, pode-se dizer que a Guerra Fria era uma Guerra de Contra-Informação.

O linux é a pedra no sapato das empresas multinacionais porque é um meio gratuito de acesso à informação, substituto dos produtos que essas corporações vendem! Da mesma forma que algumas empresas são contra a "socialização da saúde" (assista ao filme!), outras companhias são contra os programas de computador de domínio público (código aberto); eles são uma ameaça porque espalham o coletivismo e a solidariedade, diminuindo lucros trimestrais... são o anti-cristo!

Comentários anônimos liberados.

Prezad@s amig@s,
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sábado, agosto 04, 2007

Comunismo no Brasil, hermano?

Essa foi boa e merece especial atenção: o portal de "notícias" da Rede Globobo de televisão dá notícia de uma manifestação no aeroporto Juscelino Kubitschek em Brasília, na qual os manifestantes acusam o atual governo de arquitetar um golpe para instalar o comunismo no Brasil.

Essa nem eu imaginava! Então o Lula está fazendo "conchavos" com o Hugo Chavez e o Fidel Castro (aquele que estava para morrer, outro dia), para implantar o comunismo no Brasil? Que bom! Seria alguma mudança, enfim! Eu fico pasmo com esse tipo de atitude propagandística, porque ela pressupõe que o capitalismo é o único e o melhor sistema de produção econômica que existe; é a mais completa alienação possível! Essas pessoas não enxergam que é exatamente a elite industrial nacional corrupta e comprometida com o capital financeiro internacional que representa o atraso social brasileiro. Só existe miséria porque existe riqueza (concentrada). Mesmo que o comunismo fosse possível (e não é!), dividir a riqueza da 8ª economia planetária não seria de mal alvitre, principalmente porque qualquer pessoa com estudos sabe que a repartição em causa é da propriedade privada dos meios de produção (e não dos bens pessoais necessários à sobrevivência).


A pediatra entrevistada lamenta que o governo apóia financeira mente o MST (?) e que eles, os manifestantes, tiveram que se organizar via Orkut e por e-mail... Mas que coisa trágica! Quer dizer, sentados diante de seus microcomputadores Intel/AMD, utilizando banda larga ou linha telefônica, os manifestantes querem o mesmo status dos camponeses que andam quilômetros Brasil afora tentando a reforma agrária... Esse relato é trágico como toda comédia.

O brasileiro gosta mesmo de uma novela... então, tome lá uma novela interessante: o vídeo abaixo é uma produção da BBC de Londres que foi proibido no Brasil. Vale a pena assistir, porque faz parte da História brasileira. Para a sorte d@ internauta lusófon@, o filme é dublado e tem 1h e 33min de duração. Bom apetite.


sexta-feira, agosto 03, 2007

A ilusão do diploma de bacharel em Direito

Reformar o ensino jurídico: eis um desafio de titãs! Digo isso porque observo que o "mercado" acadêmico de diplomas de cursos de Direito no Brasil está vendendo a promessa de sucesso numa das mais difíceis e problemáticas áreas do saber humano: a jurídica.

Discutir se o Brasil continua a ser o "país dos bacharéis" é ignorar que ainda somos um país de analfabetos e miseráveis. Talvez, antes de ofertar um curso de Direito, qualquer universidade deveria planejar um curso sobre "distribuição de renda", para conscientizar a população tupiniquim de que não vivemos num paraíso. Entretanto, não podemos esquecer que o "curso de Direito" se converteu num "esquema" (tipo pirâmide), em que as faculdades (obviamente as particulares) lucram absurdamente com a má-formação de profissionais (?) do Direito. Bem, melhor seria classificar a grande maioria desses alunos como "profissionais do torto", tendo em vista a péssima organização dos cursos de Direito que existem por aí.

  • Os professores: a transmissão do saber jurídico
Do lado dos professores, veremos que esta categoria está sujeita a péssimas condições de trabalho, remuneração precária e uma organização do ensino que desconstrói as suas competências (quando são selecionados para ministrar disciplinas que não dominam, por exemplo). Será que um mestre ou doutor em Direito, enquanto professor, pode trabalhar como um operário? O conhecimento pode ser vendido? Como se dá a construção da participação dos alunos na construção dos saberes acadêmicos?

Fica difícil formar pessoas no mundo do saber jurídico, porque o Direito tem profundas ligações com outras áreas do pensamento humano: filosofia, ética, História, sociologia etc. Será que os profissionais do ensino jurídico têm a formação necessária para atingir essas metas, ou estamos a repetir o positivismo como a única via de percepção do Direito?

Uma coisa já se pode concluir: de todos os cenários, os professores que labutam nos cursos particulares têm sérios problemas a enfrentar (pedagógicos e trabalhistas). A uma, porque têm diante de si uma leva de pessoas que ora se comportam como aprendizes, ora se comportam como possíveis compradores de um diploma. A duas, porque se vêem confrontados com alunos que são aprovados em exames de vestibular mal organizados ou "fáceis demais para serem chamados de exame". A três, porque enfrentam a concorrência de pessoas não qualificadas (sem grau acadêmico que justifique a atividade de ensino), que além de pressionar o valor dos salários, coloca o professor como operário de segunda, descartável. Finalmente, a quatro, porque a maioria dos cursos não dispõem da infra-estrutura necessária à atualização dos professores (as bolsas de estudo e incentivo são fictícias, as bibliotecas não possuem livros ou estes são de difícil acesso aos professores e assim por diante).
  • Os alunos: consumidores de conhecimento?
Do lado dos alunos, temos algumas preocupações que precisam ser amplamente discutidas. A primeira e mais importante delas é repensar a idéia de que eles seriam consumidores. Lembrem-se da frase que diz que "o consumidor tem sempre razão". É isto o que queremos para os futuros operadores do Direito: direitos sem deveres? A única contraprestação do aluno é o pagamento das taxas acadêmicas? Não seria o caso de se discutir a relação professor-aluno e diferenciá-la da relação aluno-instituição?

Outro ponto importante: já estão ficando conhecidas no "mercado do ensino jurídico" as famigeradas listas de chamada/presença. Ou seja, o aluno deve ficar dentro de sala de aula. Aqui temos um problema enorme nas mãos: ou a aula transforma-se num espetáculo (estilo circo, aonde o palhaço é o professor), ou teremos que prendê-los (quietos?) dentro de um ambiente fechado. Isso porque, qualquer pessoa com o mínimo de raciocínio sabe que não é todo dia que alguém realmente quer estar dentro de uma sala de aula. Na pior das hipóteses, teremos ou um aluno que não participa, ou um que atrapalha o andamento em sala de aula.

***

Penso que é preciso reformar o ensino jurídico, dando-lhe a importância devida: selecionar melhor as pessoas que entram no curso (tanto professores quanto alunos); assegurar que o ensino e a aprendizagem não ficarão sob o controle da lógica do lucro, ainda que isso importe no fechamento das "fábricas de diplomas"; fiscalizar as institituições de ensino superior, para saber quando há fraudes estatutárias que influenciam diretamente as condições de trabalho dos professores; conferir maior liberdade de direção do ensino aos coordenadores e aos professores dos cursos de Direito, para que esses atores possam articular melhor soluções apropriadas ao desenvolvimento das atividades; e por fim, manter um controle de qualidade do ensino não só pelos resultados dos exames de Ordem, mas através de avaliações amplas e semestrais, que saibam respeitar a diversidade dos planos de ensino das faculdades (mas que contenham linhas gerais que não possam ser ignoradas).

A Constituição cortesã e os direitos sociais, por Antônio T. Praxedes*

Outro dia fui interpelado acerca da Constituição Federal de 1988 e a existência de um Estado de bem-estar social no Brasil. Bem, me parece que o welfare state brasileiro é natimorto ou, se é que teve alguma vida, foi efêmero; ele respira os primeiros dias dos trabalhos da Constituinte, mas, ou nasceu com o tumor do protótipo de política neoliberal brasileira, ou foi infectado pelo vírus neoconservador que já transitava no Congresso Nacional naquela altura.

De fato, a normatização dos direitos sociais no texto constitucional de 1988 foi magnífico. Congregou um conjunto de normas semelhantes ao que havia de mais avançado na doutrina européia - daí a alcunha "cidadã". Mas uma das coisas que faltaram ao Poder Constituinte foi assemelhar os direitos sociais aos direitos humanos e defini-los como direitos fundamentais da pessoa humana - deixando aos doutrinadores a tarefa de assim classificá-los. Faço uma pausa para destacar que os direitos sociais contidos na Constituição são realmente direitos humanos inalienáveis, porque são a expressão das previsões contidas na carta de intenções (softlaw) conhecida por Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 - ratificada pelo Brasil em 1989. Daquela imprecisão legislativa de que falávamos a um bocado, surgiu um defeito constitucional (a ser corrigido pela hermenêutica do STF, mas que ficou à deriva): a possibilidade de reformas constitucionais in pejus das normas protetivas dos direitos sociais ali consignadas, inclusive os direitos previdenciários. Isso porquê, não estando compreendidas dentre os direitos fundamentais da pessoa humana (cláusulas pétreas, no sentido do art. 60 da CF), esse ramo constitucional ficou à mercê da rapina neoliberal brasileira - e dos interesses do capitalismo corporativo transnacional. Chegou a ser cômica a novela em torno da reforma previdenciária: direitos adquiridos versus emenda constitucional, intervenções partidárias, muitos discursos verborrágicos e todo tipo de escândalo midiático serviu ao desmonte de uma instituição coletiva/pública de interessa nacional.

A luta pela redemocratização do País passou pela defesa dos direitos das classes oprimidas durante o período militar (por que não dizer, durante toda a ditadura que foi a História brasileira?). Os cidadãos e cidadãs brasileiras jamais tiveram a oportunidade de concretizar uma Constituição por meio de um processo democrático - sendo certo dizer que o movimento das "Diretas já!" foi uma promessa que se concretizou graças aos esforços concentrados de grupos políticos que resistiram durante o período 1964-1986.

Assim, pedindo desculpas às "senhoras da profissão", afirmo com muita liberdade que a Constituição também foi vítima do processo de exclusão social brasileiro. Ela deixou de ser cidadã e virou cortesã, servindo docemente aos interesses esdrúxulos das elites industriais nacionais - que até hoje clamam por maior flexibilização das normas do trabalho (quase apelando à escravidão!). Portanto, resta-nos, agora, planejar o funeral dessa criança natimorta, sendo lícito propor uma nova Assembléia Nacional Constituinte que seja capaz de exorcizar a Constituição programática de 1988 e trazer um novo ordenamento jurídico - um texto constitucional "mais consciente" do papel dos direitos sociais na vida da pessoa humana.* ANTÔNIO T. PRAXEDES é mestre em Direito e doutorando em Sociologia jurídica pela Universidade de Coimbra (Portugal).

Nova modalidade competitiva no PAN do Rio

Satisfeitos com o sucesso da segurança pública nos Jogos Pan-Americanos 2007, no Rio de Janeiro, os tecnocratas cariocas começaram uma campanha para aumento do contingente militar e policial nas ruas da Cidade Maravilhosa. Pois bem, mais uma vez, esse tipo de iniciativa oblitera o que é real: a criminalidade é um fato social decorrente da pobreza e da exclusão social.

Para não ter que repetir toda a bibliografia sociológica de praxe, verto meu olhar em outra direção e vejo que não são apenas os sociólogos de esquerda que têm uma opinião sobre o assunto. Freud (1928;1962) já havia detectado o desequilíbrio nas relações humanas decorrente da má distribuição da riqueza. Em seu livro "The Future of an Illusion", ele comenta que o controle e a coerção não são atos com vista somente a controlar os instintos humanos destrutivos, mas formas de garantir (assegurar) uma determinada forma de distribuição (desigual) de riquezas. O problema do Rio não é a criminalidade (conseqüência), mas a pobreza (causa).

Os cariocas vêem-se confrontados com uma realidade dual. Têm que combater a violência com mais violência. A reportagem na SIC (Portugal) sobre a opinião dos cidadãos fluminenses mostrou uma população aliviada com a presença das forças armadas dentro do Município. Bem, é curioso perceber que alguém se sinta aliviado por estar inserido numa guerra urbana. De um lado, aceitar o aumento de policiais militares é livrar-se (paliativamente e momentaneamente) da criminalidade. Mas isso não põe fim ao conflito, apenas faz com que ele se delineie nos contornos de uma guerra civil - e ninguém parece enxergar isso! De outro lado, a população ignora o fato de que as forças armadas, devido ao seu treinamento tático, não tem a menor competência para lidar com civis - e me furto de comentar isso, porque o óbvio cansa. Fico apenas imaginando um Rio de Janeiro ocupado e as classes populares sendo tratadas com a cordialidade das armas.

Como gerir o comportamento das tropas do exército nas favelas? Estaria criado um novo desporto: "tiro ao favelado"? É lastimável perceber que os munícipes daquela cidade encontram-se reféns de uma lógica cruel: ou aceitam passivamente o aumento da força e coerção ou se submetem ao poder do crime organizado. É uma situação muito confusa, mas suas origens podem ser farejadas na distância que separa a favela e o asfalto, o perfume dos condomínios de luxo e o esgoto a céu aberto dos assentamentos dos morros.

É um problema econômico-social que se converteu em caso de polícia (e de guerra!), em mais um capítulo da novela brasileira. Isso me faz pensar: que tipo de espetáculo é a competição esportiva, senão o de uma guerra não declarada?

Pela desemplastificação do humanismo

O homem foi emplastificado, portanto vivemos numa sociedade de plástico; essa é uma frase pertencente ao esquema lógico-cartesiano (verdade = autenticidade). Mas convém verificar se a decomposição daquela afirmativa pode resultar no entendimento do homem como resultado de uma sociedade plastificada.

A plasticidade do humanismo reflete-se nos contatos entre as pessoas: o sexo virtual, ou sexo seguro, que é o sexo sem sexo; a bebida alcoólica que não embriaga, porque não contém álcool; o adoçante, que é o açúcar sem açúcar... Ainda existem outras categorias, como a das relações destrutivas: o carro de 198 cilindradas, que gasta muito combustível fóssil para se locomover, num mundo aonde o petróleo está em vias de escassez; a indústria poluidora, num meio ambiente fadado à destruição e assim por diante.

As transformações que decorreram ao longo da história das relações sociais (locais, regionais, nacionais e internacionais) provocam agora uma nova torção no espaço-tempo humano, seja pela visão panorâmica do mundo [Boaventura] e do homem, seja pela nova interpretação verdadeiramente livre do mundo através dos meios de comunicação em massa [Chomsky], mas todas elas através de uma nova representação do mundo: a hiper-realidade [Baudrillard; Boaventura].

O maior pesadelo simbólico da humanidade é a conversão do real em hyper-real, do mercado em super-mercado, do Estado em sociedade global. A vida numa hyper-sociedade ultrapassou os critérios antagônicos, pela incorporação de todas as características do contraditório (a negação), e impossibilitando a criação de sínteses [Baudrillard]. Tudo o que não se enquadrar numa lógica do absurdo é considerado como velho, feio e decadente.

Do ponto de vista dos discursos, vê-se que esta hiperbolização da realidade, com o fim dos discursos radicais, criou uma nova forma totalitária de dicurso: o da universalização dos redobramentos. Não basta existir; é preciso que a existência ultrapasse o espaço-tempo em que é realizada (real simbólico) e se universalize no sistema mundo (real real) . Caso não consiga repetir-se, aquela existência deve ser internalizada [Zizek] e esquecida.

Entender o ser humano passa por compreender estes dois critérios: 1) o pensamento hipérbole (irreconhecível, ou irrealizável, pois é mais-que-perfeito, tendo suprimido os dois extremos, o imperfeito e o perfeito) e 2) a desconstituição constante do real simbólico em real real. Todas as duas são formas políticas de construção discursiva (linguagem) que servem como formas de interpretação do mundo. Assim, a repetição do núcleo duro do real real articula-se mediante a negação da negação, ou de sua impossibilidade de concretização pela absorção dos discursos extremos. O sistema estruturalista que daí pode surgir é o da desregularização dos processo de aculturação a nível local, ou a sua institucionalização a nível global pela possibilidade de cópia (espaço simbólico ou uber real) que designa um valor econômico e, portanto, um preço. Daí a afirmação de que só tem valor o que tem preço, e só tem preço aquilo que pode ser reproduzido. O espaço de produção pode ser global, mas a reprodução só traz resultados se ocorrer em nível global [Boaventura]. Tudo passa a ser objeto de consumo imediato e descartável. A sociedade de consumo consome a própria humanidade e transforma o devir num projeto absurdo (porque o futuro deixa de ser um projeto).

Assim, é preciso que surja uma nova modalidade discursiva, que consiga reestruturar o pensamento humanístico, dando-lhe algum valor ou significante que seja capaz de incorporar as gerações presentes e futuras - fazendo com que elas possam comunicar-se com o passado (é preciso reinventar o passado!). O único problema é assegurar que essa nova universalidade que se compõe tenha algo de realmente universal - ultrapassando as dificuldades impostas pela assimilação das culturas de um mundo global. Será preciso um manifesto pela desemplastificação do humanismo?

A Constituição cortesã e os direitos sociais

Outro dia fui interpelado acerca da Constituição Federal de 1988 e a existência de um Estado de bem-estar social no Brasil. Bem, me parece que o welfare state brasileiro é natimorto ou, se é que teve alguma vida, foi efêmero; ele respira os primeiros dias dos trabalhos da Constituinte, mas, ou nasceu com o tumor do protótipo de política neoliberal brasileira, ou foi infectado pelo vírus neoconservador que já transitava no Congresso Nacional naquela altura.

De fato, a normatização dos direitos sociais no texto constitucional de 1988 foi magnífico. Congregou um conjunto de normas semelhantes ao que havia de mais avançado na doutrina européia - daí a alcunha "cidadã". Mas uma das coisas que faltaram ao Poder Constituinte foi assemelhar os direitos sociais aos direitos humanos e defini-los como direitos fundamentais da pessoa humana - deixando aos doutrinadores a tarefa de assim classificá-los. Faço uma pausa para destacar que os direitos sociais contidos na Constituição são realmente direitos humanos inalienáveis, porque são a expressão das previsões contidas na carta de intenções (softlaw) conhecida por Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 - ratificada pelo Brasil em 1989. Daquela imprecisão legislativa de que falávamos a um bocado, surgiu um defeito constitucional (a ser corrigido pela hermenêutica do STF, mas que ficou à deriva): a possibilidade de reformas constitucionais in pejus das normas protetivas dos direitos sociais ali consignadas, inclusive os direitos previdenciários. Isso porquê, não estando compreendidas dentre os direitos fundamentais da pessoa humana (cláusulas pétreas, no sentido do art. 60 da CF), esse ramo constitucional ficou à mercê da rapina neoliberal brasileira - e dos interesses do capitalismo corporativo transnacional. Chegou a ser cômica a novela em torno da reforma previdenciária: direitos adquiridos versus emenda constitucional, intervenções partidárias, muitos discursos verborrágicos e todo tipo de escândalo midiático serviu ao desmonte de uma instituição coletiva/pública de interessa nacional.

A luta pela redemocratização do País passou pela defesa dos direitos das classes oprimidas durante o período militar (por que não dizer, durante toda a ditadura que foi a História brasileira?). Os cidadãos e cidadãs brasileiras jamais tiveram a oportunidade de concretizar uma Constituição por meio de um processo democrático - sendo certo dizer que o movimento das "Diretas já!" foi uma promessa que se concretizou graças aos esforços concentrados de grupos políticos que resistiram durante o período 1964-1986.

Assim, pedindo desculpas às "senhoras da profissão", afirmo com muita liberdade que a Constituição também foi vítima do processo de exclusão social brasileiro. Ela deixou de ser cidadã e virou cortesã, servindo docemente aos interesses esdrúxulos das elites industriais nacionais - que até hoje clamam por maior flexibilização das normas do trabalho (quase apelando à escravidão!). Portanto, resta-nos, agora, planejar o funeral dessa criança natimorta, sendo lícito propor uma nova Assembléia Nacional Constituinte que seja capaz de exorcizar a Constituição programática de 1988 e trazer um novo ordenamento jurídico - um texto constitucional "mais consciente" do papel dos direitos sociais na vida da pessoa humana.