Depois da insistência (agradável) de amigos -- que apenas surtiu efeito após a insinuação de que estaria sendo preconceituoso --, decidi ir em grupo para a micareta que se realiza aqui em Fortaleza, no mês de Julho. Bem, é isso que os amigos fazem: nos colocam em situações "diferentes".
Isso significa que, ao contrário de todo o bom senso -- e até de uma ou duas conversas sobre o "não ir" --, pensei que o episódio poderia me servir de alguma coisa: se não conseguisse ficar "feliz" ali dentro, iria aproveitar a ocasião para fazer aquilo que gera o desprezo/desespero de quem me conhece: analisar criticamente o comportamento de quem estava lá, e do "espetáculo" como um todo.
Uma primeira interação com alguém desconhecido foi imediatamente no portão de entrada da "Cidade Fortal". Estávamos imprensados, centenas de foliões, num empurra-empurra sem precedentes, aguardando que os organizadores se decidissem se iria ou não continuar a etiquetar os clientes (nós, como se fôssemos gado... ou éramos?). Eu estava impassível, calado. A moça me pergunta: -"Que absurdo, tudo isso, né?". Eu me limitei a olhá-la, de soslaio, e disse-lhe: -"Na minha opinião, todos nós que estamos aqui merecemos isso." Afinal de contas, não tinha razão? Bem, esta é uma narrativa -- vamos deixá-la como tal.
Logo após a liberação das catracas -- o primeiro carro-de-som (ou "trio-elétrico", como chamam) já havia passado --, como no estouro de uma manada, entramos aos montes portão adentro; até levantou poeira. Confesso que não sabia para onde ir nem o que fazer, vez que não havia nenhuma sinalização indicativa de começo/meio/fim. Não preciso dizer que o contentamento dos foliões estava estampado em seus rostos -- bem diferente da situação de 20 minutos antes, quando as vaias davam outro "tom" à noite. Quase que por um passe de mágica, tudo estava superado: não havia reclamações a fazer, nem tempo para isso, pois era muito importante correr para entrar no "bloco" e seguir o trio-elétrico.
A partir daqui, o habitual: muitos jovens já bêbados, a tal "pegação" ou "fica" (encontros casuais, temperados a beijos e muita lascívia), algumas demonstrações de testosterona e muitas, muitas garotas. Eu tinha pensado em utilizar a expressão "muitas mulheres", para indicar apenas o gênero, mas fiz questão de enfatizar que não eram nem meninas, nem mulheres adultas, mas adolescentes mesmo. Aliás: a maioria dos presentes transitava mesmo nessa faixa etária terrível, e quase todos bêbados. Não me pareceu um espaço muito apropriado para o convívio entre adolescentes, jovens e adultos -- mas quem sou eu para julgar, não é?
Eu não quero comentar sobre o estilo musical, porque estou sendo levado a crer que, hoje, depois do "Eu quero tchu, eu quero tcha", já está valendo tudo -- de dedo no olho, à puxão de cabelo. Não posso negar que o clima de histeria coletiva gerado pelo conjunto de fatores ali dispostos, acabam por te levar a dançar alguma coisa -- ou você achou que eu iria mentir e dizer que tudo está perdido? Ouvi até a banda "Chiclete com Banana" fazer uma homenagem ao Jorge Ben Jor, tocando algumas outras músicas mais elaboradas -- neste momento, não me lembro se foi Nelson Gonçalves, mas me fez lembrar dos meus avós, e fiquei muito contente.
Foto do site Se Divirta, disponível em http://www.sedivirta.net/website/index.php/festas/shows/details/5548-fortal-2012-em-fortaleza-ceara-programacao.html |
Mas qual a minha impressão geral? Ela se divide em duas partes: a visão de dentro, e a de fora.
Do lado de dentro, o Fortal me fez repensar alguns conceitos que restavam guardados a alguns anos, sobre esse tipo de manifestação em massa. Se você quer se comportar de forma instintiva, sem necessariamente estabelecer nenhuma ligação consciente de alteridade com uma multidão de pessoas, é o local ideal para se exercer o individualismo narcisista. Ali, cada um dos presentes pode se sentir um produto de consumo -- e o auge dessa sensação é durante a passagem pelos camarotes (reservados para pe$$oas de caráter mai$ elevado).
Do lado de fora, aquilo é barulho, poluição urbana, engarrafamento e pessoas embriagadas ao volante. Eu voltei de taxi, por razões óbvias, mas devo comentar que não havia uma blitz ou operação de trânsito, quer da A.M.C., quer do DETRAN/CE. O que significa que hoje, muito provavelmente, aumente o número de motoristas embriagados voltando do bairro Dunas para suas casas.
Não gostei, nem desgostei. Sou indiferente. Afinal de contas, se 99% quer, porque que os 1% devem se opor? Isso tudo é tão velho como Roma, e para "bom entendedor", meio pingo basta. Só sei que, definitivamente, essa trupe não vê mais o meu dinheiro.