Engraçado como um fenômeno natural qualquer pode ter repercussões diferentes, conforme se vai de um lado para outro. Aqui no Brasil, fica mais fácil observar isso, devido às dimensões continentais do País e à língua homogênea que facilita a troca de informações. A chuva, por exemplo, é uma benção no sertão nordestino, mas uma calamidade nas capitais (no litoral).
Na perspectiva urbana, levando-se em consideração que a maioria das capitais brasileiras encontra-se ou no litoral, ou à beira de algum rio navegável, a precipitação pluviométrica sempre traz consigo o risco de inundações, alagamentos e tudo de prejudicial à vida urbana - dos engarrafamentos, às famílias desalojadas de suas residências. Ali, a chuva é vilã. Os recentes deslizamentos no Estado do Rio de Janeiro, o transbordo de afluentes de rios no Estado de São Paulo, e problemas similares nas outras capitais são exemplos desses transtornos causados pelas chuvas. Mas será mesmo a chuva a origem desses transtornos? Não seria o uso desordenado do solo, a ocupação indiscriminada de áreas sujeitas à proteção ambiental e a falta tanto de políticas públicas e sociais, quanto de conscientização das populações no que respeita à preservação do meio ambiente social e natural?
Já na perspectiva do sertanejo (categoria em extinção por força do êxodo rural, causado pela "política da cerca/seca" e pela mecanização da agricultura), a situação é bem diferente. Essas populações vem sendo removidas do litoral desde os tempos da colonização, enfrentando hoje novos desafios, como o trazido pela fruticultura, pela agroindústria e pela expansão das grandes cidades e da transformação das zonas de pesca artesanal em pesca industrial. Para esse povo, que ocupa as terras improdutivas do semi-árido brasileiro, a chuva é uma benção divina, sinal de que a vida pode continuar, de que "Deus proverá". Nesse aspecto, essa população sertaneja (e com ela, toda a população do meio rural) sabe que a natureza não é um obstáculo, um desafio, mas um ambiente no qual o homem, através de uma espécie de parceria, consegue o seu sustento - em que pesem as adversidades e a extenuante labuta, através da agricultura familiar e auto-sustentável.
Pois resta saber quem tem razão, diante dessa divergência, qual seja, de saber se a chuva é uma benção ou um castigo, de origem divina ou fortúita. Caso em que o bom observador, sem pressa, deve refletir, para entender "aonde" está ou "se" existe um problema.
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