quinta-feira, setembro 04, 2008

Pão e circo - 2

A Sociedade de consumo, individualista e materialista tem um desafio pela frente: como manter os elevados níveis de consumo, principalmente com produtos de entretenimento, frente à crise que se aprofunda no núcleo do capitalismo desenvolvido e à beira da periferia do sistema mundo globalizado. O problema é basicamente o seguinte: como manter as populações dóceis e alinhadas com a ideologia dominante -- não interventiva, anti-coletivista e, consequentemente, anti-social --, se não há crédito nem fundos suficientes para manter os atuais níveis de consumo?

A questão que se coloca passa pela observação de um fenômeno simples de ser detectado: o consumismo que dirige as populações do Norte Global é uma fonte de valor social, nas Sociedades em que o dinheiro é inevitavelmente o mais forte mecanismo de sociabilidade. Com a crise, o funcionamento desse mecanismo social é inviabilizado. Ainda, associados ao endividamento das classes médias européias, crescem os processos de retoma de garantias hipotecárias e despejo, atingindo principalmente famílias jovens (entre 25 e 35 anos de idade), como refelte o caso do Reino Unido (75%) e E.U.A. (55%).

Assim, a perigosa equação "desemprego + endividamento" vai espalhando seus efeitos nocivos, e a pergunta que se coloca é: qual será a política social que emergirá para conter essa crise e garantir baixos níveis de criminalidade no Norte Global? Ao que tudo indica, a atual linha de conduta neoliberal permanecerá intocável "por mais algum tempo", como sinaliza a atitude omissa dos governos europeus perante a crise energética, por exemplo.

Portanto, ao que tudo indica, embora o circo esteja armado, o espetáculo não será nada divertido, inclusive porque o pão é pouco e não chegará para todos. Todos os setores do mercado lamentam a subida dos preços e o desaparecimento dos consumidores e, com a chegada das festas de fim de ano, o mercado não pode esperar aumento de consumo/vendas no comércio, porque a principal preocupação será com as contas de gás e eletricidade para o aquecimento doméstico.

Pão e circo

Qual é a ligação entre entretenimento e política? A resposta é óbvia: tudo. Desde a expansão romana que a máxima "pão e circo" alerta para a profunda ligação entre esses dois construtos sociais. Assim, pode-se afirmar que essas duas formas de expressão criativa do homem têm laços profundos na cultura e, mais explicitamente, na Sociedade de massas.

O entretenimento serve à política, e vice-versa, vez que dela colhe substrato para dramas - da tragédia à comédia. E nisso não há grande espanto. O que causa arrepio é observar o quanto essa interação é perigosa, quando observa-se um largo espectro da vida em Sociedade, e se insere a componente Economia nesta equação.

O fato é que, no atual estágio de expansão global do neocapitalismo, para que o sistema financeiro internacional possa transferir investimentos massivos das economias do Norte Global à periferia do sistema, qual seja, o Sul Global, o entretenimento tem funcionado como condição sine qua non: entretenimento e, quando ineficaz ou incompleto, auxiliado pelo controle presente na violência estatal organizada.

Por exemplo: o crescente desemprego nas economias fortemente desenvolvidas traz, necessariamente, descontentamento e diminuição da qualidade de vid das populações. Nesse contexto, pode-se afirmar que existem dois fatores principais para o desemprego: 1) a produção agropecuária e industrial está quase que completamente automatizada e 2) a produção de bens que exigem menos tecnologia foi deslocada para os países periféricos do sistema (aonde a mão-de-obra é mais barata e há menos custos de produção). Então, como conter uma população descontente, sem perspectivas de melhora em sua qualidade de vida? Dentre as várias opções políticas, a mais barata é o entretenimento.

Diante disso, a tecnologia vem prestar um enorme serviço ao atual modelo de produção neoliberal: existem vários mundos e realidades paralelas, aonde os descontentes podem encontrar algum conforto; a fantasia toma o lugar da realidade, re-interpretando-a. Daí o sucesso de bilheteria dos Matrix, Senhor dos Anéis, Hellboy e assim por diante.

Mais não era preciso ir muito longe para chegar a essas conclusões. Bastava ficar pelo exemplo brasileiro - das tele-novelas que acalentam as noites da população faminta e mal paga, que troca a luta por um futuro melhor por um bálsamo de diversão empacotado.

segunda-feira, setembro 01, 2008

A crise internacional e a estabilidade brasileira

Nos últimos meses, tenho acompanhado com bastante atenção a crise econômica que abalou o Norte Global, causada pela especulação selvagem no mercado financeiro das ações (stock options) do mercado imobiliário norte-americano: o mini-crash que ficou conhecido como sub-prime crisis.


O resultado disso nos E.U.A. e União Européia foi uma crise financeira generalizada (credit crunch), que impede a oferta de crédito e prejudica a economia (inflação de 4,4% e desvalorização imobiliária de 19% no Reino Unido, por exemplo) e as políticas de emprego. Ainda, os preços estratosféricos do barril de petróleo vêm complicar esse cenário, comprimindo um setor do mercado que cria e mantém muitos empregos (o automobilístico) e encarecendo ainda mais os produtos alimentícios.


O que causa espanto é que, pela primeira vez desde sempre, talvez em toda a História, o Brasil não sofre com gravidade as consequências dessa crise internacional. É evidente que haja uma diminuição nas exportações, mas no geral, existe todo um cenário inverso: crédito em abundância para o setor da construção civil (o que impulsiona o crescimento do mercado interno, pelo endividamento dos jovens que compram sua primeira residência e pela circulação de riquezas trazida junto com o fortalecimento de todos os setores que estão ligados à construção civil).

Ainda, a auto-suficiência energética brasileira (combustíves fósseis, bio-combustíveis e energia elétrica) colocou o País fora da crise petrolífera internacional - isso para não falar das recentes descoberdas de novas jazidas do óleo cru. Apesar das dificuldades regionais, o Brasil conseguiu ainda assumir uma postura de liderança econômica na América Latina, intermediando diversos conflitos diplomáticos e estabelecendo um diálogo aberto com os diversos governos da região - fortalecendo o MERCOSUL e concretizando a UNASUL.

Por fim, a independência do Brasil em relação ao F.M.I. e ao Banco Mundial foi uma das conquistas mais importantes dos últimos 6 anos. Sem dúvida nenhuma, a liberdade em determinar quais são as políticas econômicas e sociais a serem aplicadas no Brasil trouxeram uma maior estabilidade à economia nacional. A questão é: até quando?