sexta-feira, novembro 30, 2007

Europa: um espaço de diferenças

A Europa não é muito além de um espaço de diferenças. Percorrendo a história da formação dos Estados e da colmatação dos povos, fica fácil perceber porque a Europa não é a União Européia (U.E.) e vice-versa. Assim, convém explicar porquê o projeto de integração européia é algo mais que um sonho e bem menos que uma "realidade".

Desde seus primeiros movimentos, a U.E. teve por palco um conjunto de objetivos econômicos, isto é, embora seja amparada por valores (paz, justiça, liberdade, igualdade etc.). Quer a Comunidade Econômica do Carvão e do Ação, quer a Comunidade Européia da Energia Atômica, ou, ainda, a Comunidade Econômica Européia (depois "convertida" em U.E., pelos tratados comunitários), todas essa fases comunitárias tiveram por finalidade última o estabelecimento de um mercado comum; tudo dali derivaria: a cidadania, as instituições governamentais, a partilha de recursos produtivos, a segurança e fronteiras comuns e assim por diante. O que isso significa de um ponto de vista prático é o que todo europeu sente na pele: os processos de integração europeus não foram planejados e constituídos de uma forma democrática, mas, antes de tudo, foram planejados e executados para re-constituir o parque industrial e re-lançar o projeto de expansão (hegemônico) europeu.

Isso se evidencia durante todo o período da Guerra Fria. Naquele espaço-tempo, enquanto os E.U.A. fomentavam o aumento da produção e do consumo (criando o mercado interno que favoreceria o fortalecimento do mercado financeiro) e a U.R.R.S. criava as condições para a expansão econômica da economia planificada (gerando a acumulação primária, necessária ao crescimento econômico e à criação das infraestruturas elementares do capitalismo de Estado), o continente europeu foi o cenário no qual se desenrolou um balé diplomático interessante: ao ritmo da ameaça constante do aniquilamento nuclear, as potências européias vitoriosas aliaram sua tradição na produção industrial (dependente do carvão e aço) à disponibilidade financeira dos países do BENELUX e, com o aporte de capital advindo do Plano Marshall, começaram um projeto de reconstrução industrial.

Contudo, faltava algo para convencer a força-de-trabalho européia; a competição entre os países, que descambou numa das mais sangrentas guerras, seria substituída por uma colaboração entre as nações. Essa era a idéia inicial: uma paz duradoura através da partilha de recursos. Para que isso desse certo, tornou-se essencial o reconhecimento de um núcleo de valores morais; era inadmissível continuar qualquer projeto econômico europeu, sem assegurar um conjunto de valores sócio-políticos e jurídico-políticos que justificassem um novo esforço de expansão capitalista e de contra-posição ao avanço das idéias comunistas no continente.

Assim, mesmo que esse conjunto de valores tenham um núcleo flexível ou relativo, quanto a sua interpretação e aplicação, eles seriam o que se pode chamar de "passado comum" europeu. E essa foi a ferramenta primeva do processo de integração europeu, no que toca à procura de legitimidade dentro das comunidades. Evidente que o crescimento econômico trouxe empregos, e com eles vieram bons salários, e o resto é história. O que vale dizer, em relação ao projeto europeu é que ele não é uniforme; dentro desse espaço humano, as diferenças se fazem sentir. E é no aspecto sócio-econômico que reside um dos principais desafios à integração européia.

Quem quer que analise os índices de crescimento intra-comunitários e as metas fiscais e econômicas estabelecidas por Bruxelas sabe o que vem por aí: a reestruturação das economias mais fracas para que a produção se torne possível. O que as autoridades comunitárias estão afirmando é que será preciso reduzir cada vez mais os custos sociais do trabalho nos países semi-periférios europeus - para torná-los tão atrativos quanto os países semi-periféricos não-comunitários. A situação dos europeus não poderia ser mais caricata. O seu espaço de diferenças está se tornando um espaço de desigualdades entre os países comunitários - ou de uma "igualdade às avessas", quando comparados os países pobres do Sul com os pobres do Norte. Mas a realidade é mesmo assim. Quando os founding fathers europeus estabeleceram o projeto de império europeu, eles omitiram um fato simples: a continuidade da competição entre os Estados. E nesse aspecto, a "maquiagem" sobreposta no rosto da U.E. veio através da ajuda financeira às regiões menos prósperas - com prazo de validade já vencido.

É por essas e por outras que fracassaram as iniciativas democráticas de aprovação da Constituição da União Européia. Agora, não se fala mais em referendum; em alguns países, a adoção do projeto de Constituição não passará pelo crivo popular. E o recado dado pela Comissão foi claro: ou se está dentro, ou... auf wiedersehen, au revoir.

terça-feira, novembro 27, 2007

«Abaixo-assinado contra vídeo racista da TV Globo»

Corre na internet um abaixo-assinado contra um vídeo veiculado no Programa do Jô, da Rede Globo de Televisão. Logo nos primeiros minutos, pode-se assistir à objetivação dos seres humanos ali retratados: no caso, são comentários jocosos e discriminatórios contra a sexualidade de mulheres africanas.


O diálogo do entrevistador com o entrevistado está recheado de trechos ofensivos quer às mulheres quer à suposta "cultura sexual" das mulheres angolanas (sic).
  • Veja algumas expressões utilizadas no bate-papo:
[Comentando a vida sexual da mulher angolana, que começaria aos 06 ou 07 anos de idade, de acordo com o entrevistado:]
Entrevistado:"Ela é velha, (...) vinte e poucos anos, acabada, larga (...)".
(...)
[Rerefindo-se à escultura no cabelo da garota acima:]
Entrevistado: "Aquilo é feito com ugundi, que é leite azedo, mais bosta de boi".
Entrevistador: "Ah!... Isso deve ficar uma delícia".

***

O que incomoda os autores da petição é o fato de que a "entrevista realizada com humor expressou frases racistas metamorforseadas em piadas inocentes que eram abonadas pelos sorrisos e aplausos da platéia". Ainda, os autores da petição ressaltam que "[d]urante a reprodução do referido programa, o entrevistado, incitado pelo apresentador, deteve-se em apresentar detalhes do que denominaram "vida sexual angolana". No relato que faz, vê-se a consagração da idéia de que África e os africanos representam uma civilização homogênea caracterizada pela inferioridade cultural e biológica, legitimando a mentalidade racista sustentada no argumento de que o continente africano, os países africanos, os povos africanos, em particular, a mulher africana são inferiores e que esta inferioridade pode ser comprovada por sua sexualidade animalesca" (itálicos nossos).

Penso que, mesmo que seja possível alguma defesa jurídica da Rede Globo (Judiciário..., jeitinhos... etc...), o que se pode assistir no vídeo é uma brutal mercantilização e uma tacanha ridicularização da cultura do povo angolano; sem o menor pudor, ou sem algum interesse educacional ou de troca de experiências culturais, aquelas fotos são apresentadas ao "muito bem informado" (sic) público brasileiro como a marca registrada de uma nação (nação-irmã, lusófona e com um passado comum ao nosso!). É mais um daqueles episódios em que a "identidade cultural brasileira" tenta aproximar seus valores aos da cultura hegemônica de matriz européia, negando seu passado africano.

"¿Porqué no te callas?" - por Boaventura de Sousa Santos

O texto a seguir é de autoria do Professor Doutor Boaventura de Sousa Santos, catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (professor do curso de Sociologia). O original está disponível «aqui», no site do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Não preciso mencionar as credenciais do professor conimbricense e o respeito acadêmico que lhe é devido - ele escreve em defesa dos interesses de 90% da população mundial ou aos excluídos do processo de globalização da "economia-mundo capitalista" (usando os termos do Professor Doutor José Manuel Pureza).

Assim, "¿Porqué no te callas?" é mais uma análise lúcida sobre o desastroso choque entre o Rei de Espanha e o presidente venezuelano Hugo Chávez, na Cimeira Íbero-Americana do Chile.

- Publicado na Visão em 22 de Novembro de 2007.


«¿Porqué no te callas?»

«Esta frase, pronunciada pelo Rei de Espanha, dirigindo-se ao Presidente Hugo Chávez durante a XVII Cimeira Iberoamericana, corre o risco de ficar na história das relações internacionais como um símbolo das contas por saldar entre as potências ex-colonizadoras e as suas ex-colónias. Não se imagina um chefe de Estado europeu a dirigir-se nesses termos publicamente a um seu congénere europeu quaisquer que tenham sido as razões do primeiro para reagir às afirmacões do último. Como qualquer frase que intervém no presente a partir de uma história não resolvida, esta frase é reveladora a diferentes níveis.

«Revela a dualidade de critérios na avaliação do que é ou não democrático. Está documentado o envolvimento do primeiro-ministro de Espanha, José Maria Aznar, no golpe de Estado que em 2002 tentou depor um presidente democraticamente eleito, Hugo Chávez, com a agravante que na altura a Espanha presidia à União Europeia. Para Chávez, Aznar, ao actuar desta forma, comportou-se como um fascista. Pode questionar-se a adequação deste epíteto. Mas haverá tanta razão para defender as credenciais democráticas de Aznar, como fez pateticamente Zapatero, sem sequer denunciar o carácter antidemocrático desta ingerência? Haveria lugar à mesma veemente defesa se o presidente eleito de um país europeu colaborasse num golpe de Estado para depor outro presidente europeu eleito? Mas a dualidade de critérios tem ainda uma outra vertente: a da avaliação dos factores externos que interferem no desenvolvimento dos países. Zapatero criticou aqueles que invocam factores externos para encobrir a sua incapacidade de desenvolver os países. Era uma alusão a Chavez e à sua crítica do imperialismo norte-americano. Podem criticar-se os excessos de linguagem de Chávez, mas não é possível fazer esta afirmação no Chile sem ter presente que ali, há trinta e quatro anos, um presidente democraticamente eleito, Salvador Allende, foi deposto e assassinado por um golpe de Estado orquestrado pela CIA e por Henry Kissinger. Tão pouco é possível fazê-lo sem ter presente que actualmente a CIA tem em curso as mesmas tácticas usando o mesmo tipo de organizações da "sociedade civil" para destabilizar a democracia venezuelana.

«Tanto Zapatero como o Rei ficaram particularmente agastados pelas críticas às empresas multinacionais espanholas (busca desenfreada de lucros e interferência na vida política) feitas, em diferentes tons, pelos presidentes da Venezuela, Nicarágua, Equador, Bolívia e Argentina. Ou seja, os presidentes legítimos das ex-colónias foram mandados calar mas, de facto, não se calaram. Esta recusa significa que estamos a entrar num novo período histórico, o período pós-colonial, um período longo que se caracterizará pela afirmação mais vigorosa na vida internacional dos países que se libertaram do colonialismo europeu, assente na recusa das dominações neocoloniais que persistiram para além do fim do colonialismo. Isto explica porque é que a frase do Rei de Espanha, destinada a isolar Chávez, saiu pela culatra. Pela mesma razão têm falhado as tentativas da UE para isolar Roberto Mugabe.

«Mas "¿porqué no te callas?" é ainda reveladora a outros níveis. Saliento três. Primeiro, a desorientação da esquerda europeia, simbolizada pela indignação oca de Zapatero, incapaz de dar qualquer uso credível à palavra "socialismo" e tentando desacreditar aqueles que o fazem. Pode questionar-se o "socialismo do século XXI" - eu próprio tenho reservas e preocupações em relação a desenvolvimentos recentes na Venezuela - mas a esquerda europeia deverá ter a humildade para reaprender, com a ajuda das esquerdas latinoamericanas, a pensar em futuros pós-capitalistas.

«Segundo, a frase espontânea do Rei de Espanha, seguida do acto insolente de abandonar a sala, mostrou que a monarquia espanhola pertence mais ao passado da Espanha que ao seu futuro. Se, como escreveu o editorialista de El País, o Rei desempenhou o seu papel, é precisamente este papel que mais e mais espanhóis põem em causa, ao advogarem o fim da monarquia, afinal uma herança imposta pelo franquismo. Terceiro, onde estiveram Portugal e o Brasil nesta Cimeira? Ao mandar calar Chávez, o Rei falou em família. O Brasil e Portugal são parte dela?»

segunda-feira, novembro 26, 2007

Misteriosos são os caminhos do MERCOSUL

Pelos vistos, a integração da América Latina é um projeto desfalcado de diálogo inter-estatal. Não só a entrada da Venezuela é postergada - atrasando o projeto de abastecimento de gás natural ao bloco econômico -, mas até as relações diplomáticas entre Uruguai e Argentina comprometem a livre circulação de fatores de produção entre os dois países - afetando o comércio do bloco.

Parece que ganha força o lobby que procura estabelecer a Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) em substituição ao MERCOSUL. E, por assim dizer, com o mesmo pessimismo com que escrevo estas linhas, parece que a América Latina continuará a ser o quintal (latrina, fossa e esgoto) do continente.

Colômbia, Venezuela e o "Parceiro Oculto"

As relações diplomáticas (e comerciais) entre Colômbia e Venezuela estão ameaçadas. Esta é a notícia dada no site da BBC|Brasil. No que pese o contato entre Chávez e o General colombiano Mario Montoya, indicando o caminho de cooptação tentado pelo presidente venezuelano (que teria melhores condições de diálogo com o militar do que com os tecno-burocratas colombianos), a questão não pode ser abordada sem mencionar uma "presença oculta" no problema da Colômbia com as FARC.

Ocorre que, desde os meados dos anos 1990, os governos colombianos vêm recebendo ajuda financeira e militar dos Estados Unidos da América, para pôr fim ao movimento revolucionário naquela região. E é evidente que "muita água" corre no rio que leva aporte de capital às elites colombianas, através da cooperação yankee que, além de controlar o tráfico de cocaína e sua exportação aos E.U.A., estabelece um posto avançado norte-americano ao lado da Venezuela. É tudo, portanto, uma questão estratégica que ameaça a segurança externa do povo venezuelano.

Quem tiver dúvidas sobre esta análise, basta percorrer o site do Congresso estadunidense, localizar as ajudas financeiras que foram enviadas para "modernizar a Justiça" e o exército colombiano e tirar as suas impressões.

Delegacia: o novo lar do Bicho Papão... Parte 2

Parece que, quanto mais nós investigamos, vemos a coisa ficar pior...

Pelo menos é o que indica a reportagem sobre o caso da jovem paraense (15 anos!) que foi presa numa cela junto com adultos, no Estado do Pará. Não bastasse ter sido estuprada e estar grávida (sabe-se lá de qual dos 20 presos!), ela teria sido ameaçada de morte por policiais, caso não desaparecesse do Estado.

Leia a reportagem aqui. "Depois de solta, adolescente teria recebido recado de policiais para deixar o Estado se não quisesse morrer".

O diálogo jurídico na versão do Supremo Tribunal Federal (Brasil)

domingo, novembro 25, 2007

Delegacia: o novo lar do Bicho Papão...

O Brasil continua dando seus espetáculos de horror. O último de que se teve notícia nas terras lusitanas foi o caso de crianças presas em delegacias de polícia ao redor do Brasil (O Povo, 26/11/2007). Para lá de aterrador, tal fato revela o descaso de algumas (sic) autoridades da polícia civil (polícia judiciária) com a questão dos jovens e adolescentes no País.

Vez que faz-se pouco caso quer dos direitos fundamentais (constitucionalmente estipulados), quer dos direitos consagrados no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a questão deveria ser abordada de outra forma. Esses crimes-de-Estado contra a integridade física e moral de crianças, adolescentes e jovens - crimes que atacam diretamente a dignidade humana - devem ser imediatamente reportados à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, para que a República seja chamada a prestar contas à comunidade internacional e seja submetida ao julgamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos - caso não ofereça proteção e amparo às vítimas (leia-se, reparação por danos de toda espécie, embora eles sejam humanamente irreparáveis).


O que se pode falar acerca dessa situação, que afeta - HOJE - 685 menores ao redor do Brasil (de acordo com os dados oficiais)? Que tipo de Sociedade é esta? O centro dessas inquirições reside na vida humana enquanto um valor social a ser protegido pela República. Nesse aspecto, não se trata de averiguar apenas a proteção consignada a nível jurídico, mas observar o que se passa nos níveis cultural, político e econômico.

Em primeiro lugar, a violência social no Brasil não é um fenômeno simples, do ponto de vista cultural, estando vivas as reminiscências do passado escravagista/colonialista brasileiro; os castigos corporais, a intervenção sobre o corpo, a brutalidade da tortura, existente nos meios urbano e rural, ainda são práticas generalizadas e fazem vítimas as crianças, jovens e adultos desse País, independente de gênero mas concentradas na parcela mais pobre da população - isso para não falar da questão racial.

Em segundo, torna-se obrigatório avaliar esse quadro no contexto da completa ineficácia das políticas públicas de (re)inserção social de jovens e crianças brasileiras. As medidas paliativas aplicadas, ao invés de sócio-educativas, convertem-se em soluções penais, de enclausuramento, nas quais impera a bruteza das violações sexuais, do assédio moral (...), praticadas contra os menores. O pior exemplo disso colhe-se das antigas unidades da FEBEM, ou não?

Por fim e não menos importante, vem - como sempre - da conjuntura econômica que, ao seu turno, determina as condições sociais nas quais vivem (seria melhor dizer "sobrevivem") a imensa maioria das crianças, adolescentes e jovens do Brasil. Que tipo de projeto social é esse que não prevê nenhum futuro a essa população? Parece que o projeto ainda é aquele do trabalho intenso, mal remunerado, que acalenta o sonho dos "indianistas" de plantão - esses "teóricos da miséria" que vêem a pobreza como algo poético (...), talvez por acharem que existe alguma graça nisso. De fato, nesse aspecto, parece haver uma conexão entre o(s) plano(s) de crescimento econômico tupiniquim e a idéia de que nosso povo é (muito) dócil. Mais atenção: paciência tem limites!

Não encontro argumentos para pôr fim a este post - parece-me um problema interminável ou insanável. O que me resta é imaginar - e me dói pensar nisso - o caso da menina de 15 anos, que foi estuprada na cela duma delegacia do Pará, na qual dividia o "espaço" com outros 20 presos (adultos). Ela ficou grávida... e isso não é, nem de longe, o único trauma que sofreu.

quarta-feira, novembro 21, 2007

Cartório: o seu próximo "pit stop"

- Publicado no Blog do Mesquita.
«Brasil - Da série “Acorda Brasil” - Cartórios e financiamentos de veículos»

«Você, que está aí posto em sossego, nem desconfia que estão preparando uma “tunga” no seu, no meu, no nosso sofrido e suado dinheirinho, né?

«Pois estão. Não à socopa, como diria o sempre moderno Machado de Assis, mas às claras e em rede prá todo esse “Brasilzinho” que teimamos em manter de pé.


«Hoje, na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara Federal, na surrealista Brasília, - claro, onde mais? - suas (deles) excelências votam um projeto de lei que se aprovado, vai “enfiar di cunforça” a mão no bolso de quem comprar veículo financiado.

«A gracinha, urdida sabe lá por quais meandros “lobistas”, - Zé Bêdeu, o derradeiro abestado crédulo da Praça do Ferreira acha que não são os milionários cartórios os interessados na “tunga”, - pretende tornar obrigatório o registro em cartório dos contratos de financiamento. Se aprovado, representará uma “mincharia” de R$600 milhões, adicionais ao faturamento anual para as paupérrimas instituições cartorais. Ou cartoriais?

«Como todas as paredes no planalto central nasceram dotadas de ouvidos, elas, as tais audiófilas paredes, informam que reuniões reservadas foram feitas com suas (deles) excelências em hotéis de Brasília. Mensalão aí é trôco.

«Então, deixe o sossego e a inércia cívica de lado. Mão no teclado, passe e-mail para o deputado que recebeu seu voto e “bote a boca no trombone”.»

"1984" em 2007: O Big Brother japonês

- Publicado no Blog do Mesquita.
«Olhe essa - George Orwell está vivo no Japão»

«"1984", a genial ficção sobre o avanço do poder do Estado como “o grande irmão” fiscalizador do cidadão, cada vez mais vai se tornando realidade.

«Agora é o Japão. Lá o “Big Brother” de olhinhos puxados, começa a fichar estrangeiros. Quem quer viaje ao Japão ao Japão vai a ser fichado, tendo suas fotografias e suas impressões digitais tiradas.

«Segundo o governo, a medida é uma prevenção antiterrorista, que, contudo, despertou protestos de advogados e ativistas. A nova Lei para o Controle de Imigração e Refugiados entrou em vigor ontem e obriga o registro de dados biométricos dos milhões de estrangeiros que chegam todos os anos ao país. O governo alega a necessidade de reforçar a segurança nacional.»

Às Repúblicas (das bananas) espalhadas pelo mundo

- Publicado no blog A mente capta
«Corrupção não é exclusividade do Brasil»

«Meus caros, não é felicidade, nem espanto. Mas muita gente diz que só no Brasil, ou só em tal cidade é que acontece esse tipo de coisa.

«Pois bem, num post anterior eu falava a respeito de Madrid, capital da Espanha, candidatando-se pra ser sede dos jogos olímpicos em 2016. Hoje, na edição do El País, um dos maiores periódicos em circulação naquele reino, a manchete de capa diz:"Corrupción en el Ayuntamiento de Madrid". Anuncia o jornal que "Son sospechosos de cohecho, prevaricación y tráfico de influencias y funcionaban como "una organización estable".- El caso afecta a abogados y arquitectos.- Diez registros en tres juntas de distrito, dos concejalías, empresas y viviendas".

«Pelo visto o mal da corrupção não afeta exclusivamente a nós brasileiros, apesar de sempre a praticarmos com a maior das excelências. O problema reside não apenas em detectar essa prática odiosa, mas sim, realizar uma investigação justa, com ampla oportunidade de defesa e um julgamento justo, público e exemplar, a fim de coibir futuros larápios da res publica

terça-feira, novembro 20, 2007

Porque o "Rei" mandou...

Acho hilário rever a cena em que o Rei Juan Carlos perde a compostura. Talvez do camponês Chávez não se pudesse esperar muito, afinal, é um homem sem "etiqueta" (não é assim que se fala?). Porém, da realeza? Não é de lá que brotam os bons exemplos?

Na realidade, "a vida não anda fácil ao Chávez"; seus vizinhos latino-americanos andam de orelhas em pé com as mudanças constitucionais que o presidente venezuelano planeja (e executa com sucesso). Ainda, é evidente que as forças privadas da Venezuela, que viram suas práticas capitalistas selvagens serem desmontadas do dia para a noite, não andam muito contentes com o atual governo; e daí para a manipulação da informação pela mídia internacional (privada) é um pulo... porque o maior bem da mídia não é o zelo pela informação, mas a formação de convencimento e o retorno dos anúncios comerciais (os interesses por trás da notícia).

***

O fato é que o Rei achou que Chávez se calaria, porque "o Rei ordenou" (numa clara manifestação do espírito monarquista-colonialista).

Ora, ora, ora. Tem gente que não sabe brincar...

- O Rei mandou, todo mundo sentado.
"- Todo mundo sentou!"
- O Rei mandou, todo mundo calado.
"- Aznar é fascista!"...
- Chávez! Você não sabe brincar...

segunda-feira, novembro 19, 2007

Mídia corrompida, população alienada

Não imagino que toda pessoa tenha nascido com o destino de ser idiota. Contudo, a grande maioria consegue essa proeza? "Por que?", perguntam alguns. A resposta é relativamente simples e está ligada ao tipo de cultura que é cultivada pelos meios de informação em massa.
  • "O meio é a mensagem" (McLuhan)
Já é pouco discutível o que constitui a mensagem que chega à massa. De fato, depois de McLuhan, as pessoas que transitam nos estudos de "media and society" e estão familiarizados com os trabalhos de Foucault têm poucas dúvidas quanto à importância dos meios de comunicação na formação da opinião social (o fantasma de Goebbels). Na realidade, o meio de comunicação é a mensagem; não importa o conteúdo da mensagem (a informação que é transmitida), mas a forma como ela é transmitida (com entusiasmo, rejeição, apatia e etc.) através do meio utilizado (jornais, revistas, rádio, televisão, internet); esses útimos fatores constituem a "real mensagem", proporcionam o verdadeiro impacto ao qual reagirão milhões de pessoas.


Assim, imagino que estas palavras são frases soltas no espaço-tempo; estas poucas linhas não comovem, não excitam, nem prendem a atenção de muitos; apenas as informações "úteis" ou absolutamente "repugnantes" (conforme a subjetividade do leitor) é que prosperarão no tempo - e, talvez, nenhuma delas atinja esse intuito. Entretanto, fica a constatação de que a Sociedade da Informação está realmente inserida num contexto em que grandes empresas e abalizados profissionais determinam os rumos da legitimidade sócio-política e econômica, uma vez que conhecem os produtos informativos rentáveis e apropriados aos interesses que perseguem; esses produtos giram o mundo, porque divertem, fascinam, entretêm.

Dessa forma, toda grande campanha de comunicação torna-se um espetáculo; as pessoas sentem-se mais atraídas à diversão do quê ao enfrentamento de problemas sociais, ou os problemas sociais também podem ser transformados num espetáculo (no qual o interlocutor não é chamado a confrontar pontos de vista diversos, mas pré-determinados). A razão para isso é simples: ninguém quer discutir grandes questões, mas, antes, as pessoas querem esquecer a realidade e mergulhar no maravilhoso mundo "à la Disney", do consumo, da diversão, que os atuais meios de comunicação proporcionam, e nisso reside um grave problema. Não que diversão seja algo repugnante - de jeito nenhum. O que se torna um problema é a completa alienação dos indivíduos em relação à Sociedade; alienação esta que torna possível a continuidade de toda sorte de planejamento social desumano.
  • A questão sócio-profissional
Um dos melhores exemplos que ilustra a alienação dos indivíduos em relação à coletividade é a questão laboral. Nas sociedades ocidentais, nos últimos 150 anos, a questão laboral foi o centro das discussões políticas nos países que buscavam a industrialização e a competitividade na construção da "riqueza das nações". O debate e o protesto social estiveram no núcleo duro de todas as reivindicações políticas que culminaram com a construção dos regimes democráticos; o trabalho deixou de ser uma categoria pura (trabalho = dignidade) e passou a representar uma categoria impura ou condicionada (trabalho dignamente remunerado = dignidade).

Hoje, o interesse dos jovens pelas questões laborais está cada vez mais diluída nos prazeres do consumo imediato que obliteram a construção de projetos para o futuro (segurança). Aí está um desafio aos pensadores sociais: descobrir uma arquitetura informativa que seja capaz de incutir uma preocupação de segurança ou de um projeto para o futuro, através de uma re-valorização das relações de trabalho; isso porque o trabalho é considerado como um produto individual, formulado através da melhor competição entre os indivíduos que se degladiam no "mercado de trabalho"; competindo entre si, por postos de trabalho, cada trabalhador é uma mini-indústria, um autômato, e seu trabalho também encontra-se desvinculado de qualquer compromisso social ou coletivo.
  • A guerra e a preservação da vida com significado
Outro exemplo que pode ser dado é a ameaça à continuidade da vida com significado, diante da banalização da violência, que é trazida pela guerra (e pela propaganda favorável à guerra). Uma reflexão mais acurada pode detectar que existe um grande apelo à guerra e à intervenção militar perpassando toda a comunicação em social (que não se resume à mídia informativa, mas à indústria do entretenimento no geral); os jogos de computadores, estações de vídeo-game e, quer na internet, quer na televisão, toda sorte de filmes, desenhos animados (...), enfim, toda sorte de distração traz uma cultura de justificação e banalização da violência que coaduna com a lógica dominante no "mercado de informação".

Nesta data, a guerra produz lucros absurdos, em todos os lados do globo: a venda de armamentos, o aumento do risco financeiro nas bolsas de valores, a diminuição de matérias primas, o aumento da procura por determinado produto (...), todos esses fatores fazem com que poucas pessoas lucrem com o sofrimento de muitos. E nesse aspecto, a mensagem que se passa à Sociedade é de que "a guerra pode ser justa" - quando tal idéia não passa de um conceito monstruoso e meticulosamente planejado.

***

Ser um idiota é muito fácil, nos dias que correm. E não precisa ser analfabeto, nem desinformado. Pelo contrário: os que têm mais acesso à informação têm demonstrado maiores níveis de idiotice, porque consomem os dados como quem bebe um copo de água no deserto... Contra isso, um pouco de desconfiança, bom senso e "sabedoria popular" são essenciais para o desenvolvimento de uma mente "iluminada", ou se não "esclarecida", pelo menos bem orientada. A cultura transforma-se com o tempo, mas o tempo é domínio daqueles que controlam o Poder e as formas de enculturação. Daí a necessidade de um controle da Sociedade sobre a comunicação social.

Diferenças entre um Homem e uma ratasana

[Em comemoração às pessoas de "moral mais elavada" (sic)... essas que se alimentam da carcaça dos outros...]
Deixemos as diferenças anatômicas de lado... são banais.

O que poderia pensar um rato, se pensasse em algo? E se, dentre os primatas, algum de nós realmente pensasse? O que nos classificaria, no esquema biológico que diferencia as espécies?


1) Um rato percebe que suas melhores opções estão sempre ao alcance dos sentidos. Um ser humano sabe que algumas opções custam-lhe caro, mas arrisca-se. Mas um rato também se arrisca a capturar um pouco de queijo, e um ser humano, muitas vezes, limita-se aos seus sentidos.

2) Um ser humano cria, diversifica. Um rato segue padrões, traça rotas seguras. Nisso também se confundem ambos. Embora o roedor não possa criar fantásticas engonhocas, ele utiliza seus dons naturais para buscar novas fontes de alimento e garante sua sobreviência. De forma análoga, muitos homo sapiens insistem em padrões de comportamento que apresentam soluções "seguras" - pura ficção moral.

3) Um ser humano mantém-se firme às convicções que tem, mas não se aliena de seus sonhos. Um rato não tem convicções e não tem grandes objetivos além de procriar e aproveitar os restos de um banquete - embora algumas pessoas também assim procedam!

E aí está a grande diferença entre os ratos e os seres humanos: sonhar. O que deve prevalecer, então? O sonho ou a vil realidade? A práxis ou a utopia? E quem foi que disse que a utopia não pode se converter em práxis?

(Resposta: apenas o mais tacanho e alienado dentre os mortais acredita somente na práxis).

Os deuses que habitam entre nós

- Publicada no site Consultor Jurídico em 19-11-2007. Autoria: Aline Pinheiro.
- Enviada por Francisco Carlos M. da Ponte.
  • «O juiz é superior a qualquer ser material, diz juíza».
«Brasília, 17/11/2007 - Advogados costumam dizer que há juízes que pensam que são deuses e juízes que têm certeza. É o caso da juíza Adriana Sette da Rocha Raposo, titular da Vara do Trabalho de Santa Rita, na Paraíba. Nas palavras da juíza: “A liberdade de decisão e a consciência interior situam o juiz dentro do mundo, em um lugar especial que o converte em um ser absoluto e incomparavelmente superior a qualquer outro ser material”.

«A consideração sobre a “superioridade” natural dos membros da magistratura faz parte de uma das decisões da juíza. Ela negou pedido de um trabalhador rural por considerar que seus direitos trabalhistas já estavam prescritos. O trabalhador largou o emprego em 1982 e só foi reclamar seus direito em agosto de 2007.
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«Adriana aproveitou a ocasião de decidir tão magna questão para ressaltar, em poucas palavras, toda a magnificência da profissão dos juízes. O trabalhador, além de perder a causa, teve de ouvir coisas como esta: “Ele [o juiz] é alguém em frente aos demais e em frente à natureza; é, portanto, um sujeito capaz, por si mesmo, de perceber, julgar e resolver acerca de si em relação com tudo o que o rodeia”.

«A juíza de Santa Rita é uma atuante servidora da Justiça do Trabalho na Paraíba. Na próxima quinta-feira (22/11) ela promove em sua cidade, o projeto Conciliar e Arrematar. Pela manhã, haverá audiências de conciliação dos processos cujas partes já foram notificadas. À tarde, os processos que não foram resolvidos através de conciliação terão os bens ofertados em leilão.

«É a primeira vez que uma experiência como essa é feita na área do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região (Paraíba). Segundo Adriana o objetivo da mudança é agilizar a finalização do processo. “A idéia é solucionar os processos, seja pela conciliação, seja pela arrematação dos bens para o pagamento das dívidas trabalhistas”.
  • «Qualidades e defeitos
«A Consultor Jurídico tentou ouvir a opinião da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, mas seu presidente, Cláudio José Montesso, não quis comentar a decisão.

«Marcos Salles, presidente da Associação dos Magistrados da Paraíba, que representa os juízes da Justiça estadual paraibana, afirmou não ter lido a decisão de Adriana. Mas ouviu comentários sobre ela entre seus colegas. “Não conheço o contexto da afirmação, mas não concordo. O juiz é um ser como qualquer outro, com qualidades e defeitos.”

«Segundo ele, seus colegas comentaram que Adriana mostrou acreditar que o juiz é um profissional melhor do que os outros. “Não acho isso. Estamos em uma república. Igualdade é a primeira regra que devemos seguir.”

«O presidente nacional da OAB, Cezar Britto, também comentou as palavras de Adriana. “A grandeza da magistratura é poder julgar homens sendo absolutamente um homem. É a idéia da Justiça se auto-julgando”, disse Britto. “O juiz não é melhor nem pior do que qualquer ser humano. Pensar diferente é não compreender a função da Justiça”.
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«A sentença de Adriana foi parar no site do Centro Acadêmico de Direito da Universidade Estadual da Paraíba, junto com o seguinte comentário: “Causou estranheza a sentença proferida pela Juíza da Vara do Trabalho de Santa Rita-PB. No bojo de sua decisão, juíza afirmou que a liberdade do juiz o fazia um ser superior aos outros e que gozava ele de uma dignidade especialíssima. A soberba e arrogância dos argumentos fica visível quando a mesma afirma que o juiz é um ser absoluto e incomparavelmente superior aos demais.

«As palavras da juíza Adriana, no entanto, não espantaram um representante de classe da magistratura, que preferiu não se identificar. Ele apenas comentou que considera o que a juíza disse “normal”.

domingo, novembro 18, 2007

Sir Nei, Codó, Brasília e Juscelino

«Assisto na madrugada - Globo News - reprise de reportagem do Fantástico sobre educação no Brasil. O “tamanho do buraco” é a medida da indigência da situação escolar de alguns municípios do nosso Brasil varonil. Destaque, negativo, pois não poderia ser de outra forma, para as cidades de Caxias e Codó no Maranhão.

«Lá, crianças assistem aulas sob as árvores e a “merenda escolar” literalmente vem do céu, uma vez que, são as mangas caídas que servem de alimento para os alunos. É importante lembrar que o Maranhão, à décadas, é feudo e capitania hereditária pertencente aos Sarneys, que se sucedem nos governos, através do patriarca, filhos, filhas, adeptos e correligionários diversos.

«Sua (dele) excelência, o acadêmico senador, não se constrange com o retrato do descaso da educação no estado em que reina, enquanto posa de enfardado intelectual? Como um cidadão que se nomeia escritor não se envergonha do que acontece com a educação no seu “curral” eleitoral?
«Membro da pterodáctila Academia Brasileira de Letras - onde se ombreia com “intelectuais” do “porte” de Marco Maciel e Paulo Coelho - recentemente esteve aqui na Taba de Alencar, cometendo, quer dizer, lançando mais um de seus alfarrábios pseudo-literários. Como de costume, e como é próprio dos desvairados e colonizados, foi uma sessão de rapapés e beija-mão por parte dos almocreves locais.

«Enquanto isso, ou por causa disso, ou por tudo isso, em Brasília, o baile da Ilha Fiscal, continua. O ex-presidente Juscelino Kubitschek - aquele que nos endividou até hoje com a construção da surrealista Brasília, para cuja construção se transportava tijolo e cimento de avião -, para “convencer” os funcionários a se transferirem do Rio para a nova capital no Planalto Central, ofereceu uma infinidade de regalias e vantagens, imorais, por acintosas e nababescas, por perdulárias, que envergonham até o busto de Rui Barbosa, aposto no plenário do Senado Federal.

«Segundo reportagem de José Casado, de O Globo, ”sem controle a mordomia se alastra nos três poderes. Uma elite de 74 mil servidores federais desfruta de mordomias como auxílio-moradia de R$ 3 mil, carro de luxo, TV de LCD, celular com gasto ilimitado, apartamentos com banheira de hidromassagem e enxoval renovado a cada dois anos. Hoje, a elite do funcionalismo ganha 24,5 vezes a renda média do brasileiro e é mais bem paga que a cúpula burocrática dos Estados Unidos”.
«“Três anos atrás, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, começou a desfilar a bordo de um Chevrolet Ômega e, desde então, o carro fabricado na Austrália virou símbolo de poder na capital da República. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por exemplo, gastou R$ 5,4 milhões na compra de 37 deles - 33 para seus juízes e mais quatro para a diretoria. O Senado, a Câmara e alguns ministérios adotaram o estilo. Cada sedã importado custa US$ 81 mil (R$ 146 mil). O modelo só consome gasolina - e muita, à média de um litro para cada seis quilômetros”.

«“Sua inclusão na frota pública é paradoxal, sobretudo num governo que faz propaganda dos biocombustíveis como alternativa para um mundo ameaçado pelo efeito estufa. Mas esse é apenas um detalhe: a conta de luz das repartições federais já soma R$ 3,9 milhões por dia útil. Gasta-se R$ 954 milhões por ano para iluminar os prédios públicos - 200 vezes mais que o investimento governamental realizado no programa Luz para Todos. Vantagens compõem 37% dos salários”.

«“O dinheiro dos tributos paga tudo, dos desperdícios aos privilégios de um grupo de 74 mil pessoas que detém os altos cargos do governo, do Legislativo e do Judiciário. É a elite civil do contingente de 2,2 milhões de servidores públicos (17,5% do total de assalariados), entre os quais 1,1 milhão ativos”.»

sábado, novembro 17, 2007

Xenofobia e racismo na U.E.

A maioria das pessoas costuma creditar "todos os problemas do mundo" aos E.U.A e ter, ao mesmo tempo, uma visão romântica da Europa. Essa visão é tão enganosa quanto aquela que atribui ao Brasil a pecha de paraíso na Terra. A Europa sempre foi palco de desgraças sociais, e as piores delas sempre foram o racismo e a xenofobia.

Uma doutrina racista é toda crença na superioridade de uma raça sobre todas as outras; se apenas uma raça encontra-se no cume hierárquico, ela deve ser preservada, seja através da eliminação de todas as outras, seja através da endogamia racial. A xenofobia (xénos, estrangeiro + phob, r. de phobein, ter aversão) é a aversão que uma pessoa ou um determinado grupo tem em relação a pessoas estrangeiras. São dois fenômenos diversos, porém estão relacionados à noção de grupo (sentimento de pertença e/ou identidade, conforme o caso); são reflexos da concepção sistemática de Sociedade, embora não se possa afirmar se pertencem exclusivamente às concepções organicistas ou mecanicistas. O certo é que o racismo é um sistema de crença e a xenofobia uma sociopatia.

O receio das autoridades comunitárias da União Européia (U.E.) em relação ao racismo fez com que os representantes governamentais europeus criassem o Observatório Europeu do Racismo e da Xenofobia (atual
Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia). Esse órgão comunitário tem a função de mapear, fiscalizar e reportar os casos de xenofobia e racismo, ajudando a U.E. a traçar estratégias políticas para conter o avanço desses sentimentos no território europeu. Isso porque a U.E. precisa incentivar a emigração para seu território - vez que sua mão-de-obra e número de jovens decrescem todos os anos. Além do mais, a livre circulação de pessoas e fatores de produção no espaço comunitário (um dos pilares da integração européia) pode ser afetada, na medida que a xenofobia impeça que trabalhadores dos países semi-periféricos (do Leste Europeu) se desloquem às grandes capitais européias em busca de trabalho.

Seja como for, a Europa não é (e nunca foi) um "paraíso social". O espaço de tolerância que aqui pode existir depende sempre do limitado contato dos povos nativos com os estrangeiros. O certo é dizer que aqui existe de tudo. Porém, o mais certo é dizer que sempre existe mais calor humano quando é maior o respeito mútuo entre os indivíduos.

sexta-feira, novembro 16, 2007

Aos Democratas... ou à direita de orgulho ferido

O Partido da Frente Liberal (PFL) mudou de nome. Agora, chama-se "Democratas" (sic). Não vou perder muito tempo contando a história desse partido. Apenas acho satírico que tenha mudado sua designação, de liberais para "democratas"; há uma longa distância entre um liberal e um democrata.

O que parece mais certo é que esses elegantes membros do liberalismo nacional continuam com suas técnicas de manipulação da opinião pública nacional - mas, enfim, é isso mesmo o que a política é... manipulação de opiniões. Uma de suas mais fortes críticas está centrada no governo populista de Lula; chegam a lançar na mídia que o atual governo do Planalto estaria arquitetando um golpe político que poria fim à democracia brasileira. Contudo, antes de continuar, é preciso enquadrar o discurso do PFL... digo, do "Democratas" (sic) no contexto de uma América Latina em transição.


Primeiro, é necessário explicar que a democracia latino-americana saiu de um viés puramente elitista e liberal, em que as decisões econômicas estavam centradas apenas no crescimento econômico, havendo escassos investimentos na área social. Para se constatar isso, é só analisar os primeiros governos civis pós-1988 no Brasil e ver o tamanho do estrago na Educação (desmantelamento das universidades e outras instituições de ensino públicas), nos direitos dos trabalhadores públicos e privados (fim da estabilidade no emprego, cortes nos gastos com segurança social), no patrimônio público nacional (as privatizações criminosas!) - tudo isso foi o elitismo. Embora a corrupção e o descaso com a coisa pública continuem fortes como nunca, pelo menos hoje qualquer governo que queira permanecer no Poder tem que pôr em prática "políticas placebo" - que não resolvem nenhum problema, mas agradam a população (isso é o tal populismo).

Segundo, o fato de a política norte-americana ter dedicado total atenção ao Oriente Médio tornou possível o ressurgimento de movimentos de esquerda ou movimentos populares na América Latina. Antes, todo tipo de insurreição contra o poder liberal era logo rechaçado militarmente, com o apoio yankee; são exemplos disso as guerras civis e ditaduras arquitetadas e dirigidas pela Central Intelligency Agency (C.I.A.) em: El Salvador, Nicarágua, Chile, Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai... não é preciso continuar. O continente todo já foi vítima direta e indireta das políticas de intervenção norte-americanas que garantiram o que todo mundo já sabe: somos o quintal dos "américas". Ironicamente, o único insucesso norte-americano foi Cuba - e eu me pergunto: "por que será"?

Terceiro, os tratados de livre comércio assinados entre os latino-americanos começaram a pôr em causa a hegemonia e ingerência econômica norte-americana, trazendo benefícios diretos e indiretos ao comércio dos países do Sul global. Ora, o sucesso das exportações e do comércio entre os países latino-americanos é muito recente; isso tem beneficiado enormemente o Brasil, que colhe bons resultados a nível regional e excelentes resultados em nível internacional. Inclusive, não faz mais 06 anos que o Brasil e seus parceiros regionais do Mercosul começaram valiosas parcerias tecnológico-industriais com países como Rússia, Índia e China e, ainda, iniciaram uma expansão rumo à África.

Por fim, e como não podia deixar de ser, o mais importante: o comércio mundial está de olho no petróleo da América Latina. Aonde você acha que as grandes potências vão cavar, quando secarem as reservas de petróleo dos árabes, caro leitor? E nesse ponto todos concordam, não há cá conversas: o petróleo ainda é o carro chefe do mundo industrializado. Todos criticaram o Evo Morales (Bolívia) por ter nacionalizado o petróleo e as empresas petrolíferas bolivianas; porém, pergunto a qualquer general de cinco estrelas se ele é favorável à privatização da Petrobrás e ele diz um audível e quase ensurdecedor "não!". No Brasil, todos acharam ruim porque o presidente boliviano "pegou o que era nosso"... Mas esquecem-se que o gás e o petróleo são as únicas moedas disponíveis para que a Bolívia saia da lama - disso ninguém quer falar.

E tudo isso para criticar o PFL..., perdão, o "Democratas". Eles acusam o atual governo de populista, mas esquecem-se que agora, caros amigos, a opinião do povo tem um peso muito maior do que no passado. Superada que está a discussão da existência ou não de direita e esquerda no Brasil, o que convém dizer é exatamente aquilo que poucas pessoas querem ouvir: a democracia na América Latina não é racional, é passional. Quem quiser conquistar um governo, agora, terá que cair nas graças do povão; e este último personagem vai cobrar cada "centavo democrático" que a História direitista latino-americana lhe roubou.

quarta-feira, novembro 14, 2007

Os riscos de consumir qualquer coisa no Brasil

Nas experiências que troco com pessoas que viajam pelo mundo, sempre aparecem os "consumos de risco", isto é, os tipos de comida, hábitos noturnos e zonas urbanas a serem evitados. Entretanto, quanto mais avança a defesa do consumidor no Brasil, mas aparecem riscos que antes desconhecíamos dentro do nosso País.

Depois dos laticínios com soda cáustica, a mais absurda notícia foi dada em relação ao brinquedo Bindeez (Moose Enterprise / Long Jump) que, em contato com a água, libera uma substância chamada GHB ou "ecstasy líquido". Ou seja, ser criança e brincar pode ser um verdadeiro "barato" ou uma alucinante "viagem".

Isso me faz lembrar as barreiras sanitárias e alfandegárias da União Européia. Para que possamos exportar alimentos e toda sorte de produtos à U.E., temos que submeter nossos produtos a infindáveis testes, para não falar que, no que respeita à produção nacional, qualquer incentivo fiscal às exportações é condenado como "subsídio".

Depois falam em livre comércio. O comércio não pode ser livre! Ele tem que ser fiscalizado e submetido a rígidos critérios de controle, para que os consumidores sejam devidamente protegidos contra a prática abusiva de indústrias corruptas que, por não conseguirem entrar em mercados sérios, empurram toda sorte de lixo aos países periféricos e semi-periféricos.

segunda-feira, novembro 12, 2007

Tributos e o meio ambiente

É dever de toda pessoa preservar o meio ambiente. Isso é inquestionável. Entretanto, alguns grupos e uns poucos acadêmicos e "burocratas de plantão" parecem gostar de abusar da inteligência dos outros, quando o assunto é meio ambiente. Digo isso porque me deparei, hoje, com a seguinte enquete da BBC|Brasil: "Você concordaria em pagar mais impostos para melhor proteger o meio ambiente?"

Bem. A pergunta é bem elaborada porque, de uma forma ou de outra, todos nós somos responsáveis pela poluição e destruição ambientais, porque consumimos os produtos que são fabricados pelas empresas poluidoras. Mas o que parece estúpido é achar que qualquer cidadão pagará diretamente ao fisco uma taxa ou imposto de proteção ao meio ambiente. Na realidade, até pagará, mas indiretamente, isto é, as empresas é que devem ser tributadas e, assim, o "prejuízo" será repassado aos consumidores, através do aumento do preço das mercadorias. Essa é a fórmula tradicional que revela ou explicita a inflação real; tributar o cidadão é forma de mascarar tanto a responsabilidade dos empresários, quanto a falta de políticas públicas eficazes de proteção ao meio ambiente. Necessário é fiscalizar e punir os infratores - legislação para isso não falta.

A relação entre o observador e o objeto

Ao contrário do que possa parecer, ou melhor, ao contrário do quê é dito, a melhor forma de compreender um fenômeno social é a máxima interação entre o observador e o objeto, ao ponto de uma mistura entre ambos. E isso também se aplica ao exame das condições sócio-políticas de uma determinada Sociedade. Porém, é necessária certa distância na hora de tirar conclusões...

No que respeita aos estudos sociais, penso que as melhores oportunidades de avaliação de qualquer agrupamento social surgem após a imersão; quando o estudioso retira-se de um determinado contexto social e passa a conviver com outros grupos (adquirindo uma nova perspectiva), ele adquire as condições de melhor compreender o que se passava ao seu redor. Isso é curioso e preocupante. Curioso porque, após a distanciação, ficam claras as diferenças culturais que trazem singularidade às relações sociais de uma população específica - na qual co-habitava o observador - interação social ou "vida com significado" (zöë). E é preocupante porque, depois de várias reflexões, fica alterada a percepção que o observador tem de si, enquanto criatura que conviveu com o tal agrupamento.

Portanto, nenhum indivíduo pode tirar conclusões acerca de nenhuma Sociedade ou agrupamento humano, sem seguir duas premissas: 1) viver a realidade desse objeto, adquirindo, assim, o seu universo de referência como observador e 2) extrair-se desse mesmo ambiente, para observar aquele objeto a partir de um plano mais alto.

O reacionário, o conservador e o indignado

- Com a contribuição de Pedro Figueiredo (PT).

Para iniciar, é preciso delimitar o meio ambiente social no qual atuam as elites políticas brasileiras. Elas ocupam o Poder Público, os bares e restaurantes, as médias empresas locais e as filiais de grandes companhias (nacionais e estrangeiras). Essa classe social (a elite) aproveita "la belle vie" e, como acontece na maioria do território nacional (constituído de "províncias agregadas"), estampa um sorriso "à la Tio Sam" no rosto de que se considera um "bon vivant"; ela passeia de carro importado e vira a cara quando vê uma criança carente e de pés descalços na rua; tem carro blindado e segurança armada; vive em condomínio fechado... ignora a pobreza nacional.

Nesse contexto, operam os reacionários e os conservadores. Os primeiros, agem com o claro objetivo de manter o status quo; contra esses, há pouco o quê fazer, porque são pessoas que têm seus pensamentos estruturados num sistema de crença peculiar. Sim, o reacionário é um crente; ele crê no progresso da tecnologia, na expansão eterna da produção e na exploração da força de trabalho; acredita que é importante a segregação entre as classes, porque disso depende o seu conforto; pode ser racista ou xenófobo, e por aí vai a lista. O engraçado é que esse comportamento do reacionário é alimentado pela omissão do conservador; o segundo é um preguiçoso intelectual e, acima de tudo, comodista; ele parasita o sistema social. De fato, o conservador alimenta-se diretamente da estrutura sócio-política criada pelo reacionário, mas não é um crente; não tem força de vontade; da mesma forma que não luta para mudar o estado das coisas, também não é ele quem age para reafirmar esses tais valores; ele simplesmente espera que os outros lutem por ele, aguardando obter alguma vantagem com isso.

Essa pode ser uma das leituras válidas a ser feita sobre a "exuberante classe liberal" brasileira. E que se diga que o termo "liberal" é aqui empregado em sentido amplo. Sim, porque ser liberal é acreditar na liberdade do indivíduo como sendo valor social primário, nos cânones da Ciência política - daí poder-se afirmar que trata-se de um sistema de crença. Quem é liberal subjuga (teoricamente) a igualdade; coloca o indivíduo em primeiro lugar e, depois, a Sociedade; o liberal vive de acordo com as regras do liberalismo e crê na máxima "quanto mais igualdade, menos liberdade". É egoísta, porque o egoísmo é a base de sua sobrevivência - embora seja a ruína de muitos outros. Acredita na caridade, porque ela retira-lhe o peso da culpa e ajuda a preencher sua vida vazia e obscura - caridade faz bem à saúde e é um complemento às atividades físicas saudáveis e às drogas anti-depressivas, mas não põe fim à pobreza.

É evidente que a falta de mobilidade econômica, a inexistência de uma rede solidária de movimentos sociais emancipatórios ao redor do País (principalmente no Centro-Oeste, Norte e Nordeste) são todas conseqüências da baixa escolaridade em que está imersa a grande maioria da população brasileira, massivamente. Também é claro que existam outros fatores culturais que influenciam a continuidade desta situação, que podem ser facilmente detectados no exame da História nacional. A tradição que corre nas veias das elites políticas brasileiras é a do abuso de autoridade, concentração de terras e riquezas, e de violência na manutenção da pobreza. Não obstante isso, o povo (a grande vítima, a "massa de manobra") continua "gentil e acolhedor", porque, enfim, essa é a condição humana: a imprevisibilidade que faz brotar alegria e fraternidade, donde antes só nascia dor e fome. Quem entende tudo isso muito bem torna-se um indignado...

[Ao meu pai.]

domingo, novembro 11, 2007

O Rei e o Camponês

O incidente entre o rei de Espanha Juan Carlos e o presidente da Venezuela Hugo Chávez foi assunto na imprensa européia. Bem, isso é o que acontece quando "o povo" vem parar na festa dos "reis". Chávez teria chamado o ex-primeiro ministro espanhol de fascista, durante o discurso do representante espanhol, na cúpula ibero-americana, neste fim de semana.

É claro que os representantes governamentais e agentes diplomáticos devem respeitar o protocolo. Mas o que custa "um pouquinho de verdades numa festa de vaidades"? Qualquer espanhol com juízo sabe quais são os percursos políticos da direita madrileña. Porém, o cômico é ver uma ditadura de esquerda apontar o dedo à de direita. Opa! Não... Ambos são governos eleitos democraticamente. Afinal, quem tem razão? O Rei ou o Camponês? Eu voto no segundo.

sábado, novembro 10, 2007

O Brasil , a OPEP e o meio ambiente

A descoberta de novas jazidas de hidrocarbonetos no Sudeste do Brasil parece ter elevado a "moral" do Itamaraty além dos limites. Embora as reservas brasileiras em petróleo e gás natural tenham-se elevado em 60%, convém dizer que é demasiadamente cedo para que o Palácio do Planalto arvore-se como membro da OPEP, porque a lógica do mercado de combustíveis demonstra que um grande consumidor (que tem deficit no abastecimento do mercado interno) pode ter dificuldades tremendas de ser um grande exportador e, consequentemente, de conseguir influenciar o preço do crude no mercado internacional.

Ainda, convém lembrar que vive-se num período de peak na extração do petróleo; grandes mercados, como o europeu, já praticam vultosos investimentos em novas tecnologias energéticas, sendo o hidrogênio a verdadeira aposta no médio prazo. O petróleo foi o combustível do século XX, mas a sua extração já atingiu custos que tornam cada vez mais cara a sua extração; seja proveniente dos desertos do Oriente Médio, ou do solo africano, seja retirado das plataformas continentais, o crude tem os dias contatos no que diz respeito ao abastecimento dos grandes centros mundiais. A Europa, por exemplo, já tem vários outros projetos relacionados à produção de energia (eólica, das marés, solar e etc.), tendo desistido de todos os planos de investimento industrial no óleo bruto; o uso do petróleo é condenado pelo excesso de emissão de monóxido de carbono e pela dependência estratégica em relação aos países produtores desse combustível - os europeus procuram fontes de energia limpa e sócio-economicamente viáveis. Por outro lado, os E.U.A. continuam a utilizar o "ouro negro", por disporem de uma estrutura econômica e militar completamente dependente deste produto; anualmente, o sistema financeiro norte-americano dirige uma soma astronômica à "indústria da guerra", tornando possível as ações militares no Oriente Médio, necessárias ao abastecimento energético deficitário yankee.


Dessa forma, a pretensão brasileira - de incluir o Brasil na OPEP - é, antes de tudo, um erro estratégico. Além do mais, a idéia de que o Brasil poderia influenciar uma desejada queda do preço do barril no mercado internacional está limitada pelo crescimento do consumo interno e pela escassez do produto. Entretanto, considerando as últimas altas no preço desta commodity, parece que os economistas brasileiros estão ansiosos em sacrificar o preço dos combustíveis no mercado interno, almejando o aumento das exportações nacionais e, consequentemente, um superavit na balança comercial - o que pode ter efeitos negativos na formação do mercado interno e no crescimento industrial brasileiro.
  • Uma última nota
Festejar o biocombustível é digno de reprimenda. Como bem indicam os analistas, os efeitos nocivos (sociais e ambientais) desse tipo de produção superam as benesses que porventura possam advir de seu emprego. A uma, porque a quantidade de solo requerido para a produção dos mesmos afetará o uso apropriado da área agricultável - gerando mais devastação florestal e acarretando o uso abusivo dos solos. A duas, porque dará continuidade a existência dos latifúndios, fazendo com que a produção agrícola sustentável e minifundiária/familiar seja descartada dos planos governamentais. Finalmente, nenhum país deve apostar numa única via para suprir suas carências energéticas.

Além da combinação de diversas fontes energéticas, de acordo com as potencialidades de cada região, deve-se ter em mente que, um plano global de uso racional da energia tem que levar em consideração tanto o consumo racional e tecnologicamente apropriado (industrial e particular), quanto a limitação dos danos ambientais (potenciais e efetivos) que venham a ser detectados.

segunda-feira, novembro 05, 2007

"The Fog of War"

O vídeo abaixo tem feito parte das minhas reflexões nos últimos meses. Ele foi-me apresentando pela primeira vez por Raphael Commins (Middlesex University / Londres), e é um dos meus vídeos preferidos: "The Fog of War - 11 lessons from the life of Robert Strange McNamara".

Este filme em forma de documentário revela a "lógica da guerra"; lógica que vem governando o mundo talvez desde sempre, porém mais acentuadamente depois da Segunda Guerra Mundial. É o tipo de "lógica" que ignora a vida humana enquanto um "valor", que trata seres humanos como números, que desperdiça recursos naturais em nome da "ordem e do progresso".

Para quem não o conhece, Robert Strange McNamara foi presidente das indústrias Ford, secretário de defesa das administrações de J.F. Kennedy e de L. Johnson (durante o Vietnam), e foi chairman no World Bank por mais de 30 anos. E este vídeo é a sua versão dos acontecimentos que marcaram os últimos 60 anos da História da Humanidade.

Idioma: inglês (sem legendas) / duração: 1h 47m - imperdível.

quinta-feira, novembro 01, 2007

Eu não "cansei"

Fico imaginando que é chegada a hora de o brasileiro mudar a sua perspectiva em relação aos problemas do País. A hipocrisia dos movimentos do tipo "cansei" é tamanha que causa espanto não haver um posicionamento sério de sociólogos e cientistas políticos, no sentido de esclarecer a verdadeira postura e os interesses dessa pequena parcela da população que está "cansada".

O fato é que esses movimentos estão contando com o apoio dos canais de formação de opinião no Brasil; fica evidente observar quem são os principais atores que comandam o tal espetáculo: a grande mídia, os profissionais liberais e, no geral, as classes sócio-econômicas A e B. É evidente que, numa democracia, todas as vozes encontrem seu espaço de legitimidade. Entretanto, o objeto sob o qual incidem as "reclamações cansadas" é pontualmente político; as reivindicações não propõem mudanças concretas em relação à distribuição de riquezas, miséria, espaço urbano e vida social com dignidade. Os ataques são todos à corrupção que está instalada (em todos os cantos) da política brasileira - com especial destaque ao Governo "Lula"; nesse último aspecto, é claro que acabam por ter "toda a razão". Ora, bem vistas as coisas - e bem lidos os documentos e manifestos -, não parece haver qualquer proposta concreta que ajudasse a limpar o cenário político nacional - exatamente porque não é este o problema. O que ocorre é que a tradição política brasileira é exatamente essa: momentos de alternância entre ditaduras e democracias. E os grupos que comandam esses períodos abusam da res publica e do povo, por várias e diversas razões. Escolhendo algumas, deveríamos citar a forma federativa de Estado (que congrega uma miscelânia sócio-econômico-cultural), a não observância dos mecanismos legais de controle da participação democrática e a ineficiência dos sistemas de ensino.


Além do mais, a concentração de riquezas, o controle centralizado dos mecanismos de comunicação social (mass media) e a concentração do saber (por conta dos baixos índices de escolaridade) facilitam a disseminação de padrões de comportamento orientados à perpetuação de um sistema de exploração de classes dos mais cruéis existentes no mundo. Qualquer pessoa que esteja ciente do conteúdo relativo aos direitos humanos pode assegurar o que segue: o Brasil (enquanto instituição social) é contumaz violador dos direitos fundamentais da pessoa humana, em todos os seus aspectos. E quando se fala "o Brasil", leia-se "as elites econômicas que controlam os processos de produção e reprodução sociais".

Ora, qual é o verdadeiro problema? É o sistema, per si; ao invés de procurarem combater ideologicamente a infra-estrutura injusta e selvagem que condena a grande maioria da população a viver na miséria, a bússola de preocupações da "outra parte" (a minoria) está apontada para os problemas que afetam a qualidade de vida e a dignidade burguesa; são as "pequenas indignações", partes da própria estrutura social na qual encontram-se os "cansados", isto é, o feudo-capitalismo brasileiro, que tem suas raízes no sistema escravagista/aristocrata colonial. Não é a toa que uma dessas bússolas tenha sido responsável pelos ataques ao Estado do Piauí: como todo instrumento desta natureza, ela aponta ao Norte e é "lá" que está o "Brasil que o Brasil não quer ver". Reclamam da corrupção, mas alimentam-se dela - porque num país de miseráveis, de milhões que passam fome, a corrupção começa e termina na continuidade dessa perversidade. Reclamam dos atuais políticos, mas esquecem-se (de propósito) que eles são o fruto de uma árvore má; eles representam tanto a confirmação, quanto a contradição daquilo no qual estão inseridos: na política corrupta de continuidade da Sociedade de Exclusão. E que não me venham atacar a pobre democracia, porque ela não pode se tornar possível ou realizável nesta atual estrutura social brasileira - para que haja capitalismo, não é preciso democracia. Aliás, quanto menos democracia, mais capitalismo, mais exploração e mais miséria.

Corremos o risco de viver uma cidadania às avessas. Ao invés de ficar reclamando de que a população não tem a devida proteção (para tomar uma dose de whisky durante o happy hour), ou que está cansado de "pegar engarrafamento" no caminho para casa (o que aumenta o gasto com ar condicionado nos carros importados de 100 cv.), o cidadão consciente deveria abordar os verdadeiros problemas sociais brasileiros: fome, miséria, exploração, analfabetismo. É por isso que eu não "cansei", nem posso cansar e, por isso, vou insistir vezes sem fim neste tipo de argumento. E você, cansou?